Ser conselheiro não é sucessão de vida executiva
Ter conselheiros com competências adequadas e complementares pode ser o grande diferencial que conduz à perenidade, à construção da resiliência e à sustentabilidade das empresas.
Ana Paula Zamper, Conselheira e Tech Expert. (Foto: Divulgação)
O momento atual pede discussões mais profundas sobre governança corporativa. O que de fato faz uma empresa ter estruturas de governança que garantam sustentabilidade nos negócios, inovação e perenidade? Qual o papel dos conselhos frente aos desafios mais complexos impostos pelos avanços da tecnologia, ao acirramento das disputas concorrenciais e aos intricados caminhos regulatórios?
Ter conselheiros com competências adequadas e complementares pode ser o grande diferencial que conduz à perenidade, à construção da resiliência e à sustentabilidade das empresas.
Com o aumento da complexidade dos negócios e a crescente demanda por transparência, uma boa governança atua como um escudo protetor para as empresas, evitando riscos desnecessários e elevando o valor estratégico das companhias.
O papel do conselheiro mudou. No passado ele era frequentemente visto como um agente passivo, com influência limitada nas decisões estratégicas. As empresas cumpriam suas obrigações perante os órgãos reguladores e esse conselheiro atuava de forma mais simbólica.
Atualmente, diante das incertezas e novas prioridades, o mercado impôs uma transformação, redefinindo substancialmente sua função.
Magali Leite, CEO da Espaçolaser e presidente do Ibef-SP. (Foto: Divulgação)
A vigilância (ou o accountability) ganhou mais peso, o que aponta para a necessidade de uma competência mais direcionada dos conselheiros, que é a orientação aos gestores na geração de máximo valor para o negócio e na sustentabilidade em longo prazo.
O mercado passou a enxergar os conselheiros com o seu devido papel estratégico e não apenas como parte de uma estrutura que dá aval à administração da empresa.
Uma vez mais expostos, eles também passaram a ser mais cobrados.
E toda essa visibilidade tem despertado desejos e entendimentos equivocados em diversos profissionais. Há questionamentos frequentes sobre como iniciar a atuação em conselhos de empresas. Não que isso seja ruim, mas é preocupante porque dá a impressão de minimização do papel de um conselheiro, como se fosse uma etapa sucessória da carreira de executivo.
Patrícia Marins é cofundadora do WOB e fundadora da Oficina Consultoria. (Foto: Divulgação)
Bons conselheiros têm trajetória profissional, experiência testada e comprovada, mas também características e competências próprias para o desempenho da função.
Não basta passar pelo mercado corporativo e se candidatar uma vaga em conselho. Não basta ser ou ter sido um profissional eficiente. Ser conselheiro não é um passo automático na vida de qualquer executivo, como uma sequência natural após certa experiência profissional.
Ser membro de conselho é um trabalho que exige horas de dedicação, meses de preparação e anos de estudo, além da humildade de entender que, ao iniciar um trabalho que nunca se fez, volta-se a ser estagiário. No dia a dia de um conselheiro, as demandas são absolutamente diferentes daquelas vividas como profissional do mundo corporativo.
Apoiar estrategicamente nas estruturas de governança, acima de tudo, é ter a capacidade de produzir analises complexas e orientar de forma prática as cadeias de gestão. Não é uma mudança superficial, pois a atuação põe em risco o bem maior que se tem, que é a reputação.
Da mesma forma, as companhias precisam ter mais rigor nas escolhas de seus membros de conselho, estabelecendo processos claros, estruturados em expertise - não apenas em indicações e relacionamentos.
Infelizmente, a maioria dos processos seletivos de conselhos ainda opta por selecionar perfis profissionais com formação ou experiência nas áreas mais clássicas como finanças e jurídico, com baixa diversidade, dando preferência para homens e com idades similares.
O que impera ainda é o networking pessoal na definição desses membros, geralmente escolhidos por serem mais diplomáticos e menos questionadores para desafiar o status quo.
Critérios como habilidades, experiência, gênero, idade, origem, amplo conhecimento, visão de mundo e reputação ilibada são vitais para entender os múltiplos riscos que uma empresa pode enfrentar.