'O momento de investir no Marrocos é agora', afirma o embaixador Alexandre Parola

Embaixador do Brasil no Marrocos fala sobre o avanço das relações bilaterais e as oportunidades para empresas brasileiras em diferentes áreas.

 

PAROLA
Alexandre Guido Lopes Parola, embaixador do Brasil no Reino do Marrocos. (Foto: Divulgação)

As relações entre Brasil e Marrocos vêm ganhando tração nos últimos anos, sustentadas por interesses convergentes em áreas como agronegócio, logística, fertilizantes, infraestrutura e energia. O crescimento do comércio bilateral, aliado à crescente inserção do Marrocos no cenário africano e mediterrâneo, tem chamado a atenção de empresários e autoridades brasileiras para novas frentes de cooperação.

À frente da Embaixada do Brasil no Reino do Marrocos, o diplomata Alexandre Guido Lopes Parola tem acompanhado de perto esse processo. Economista de formação pela UFRJ, com mestrado pela UnB e doutorado em Filosofia pela Catholic University of America, Parola também realizou pós-doutorado na Universidade de Oxford. Com passagens por Washington, Londres, Paris, Genebra e Santiago, atua hoje na promoção de parcerias entre os dois países com foco em desenvolvimento econômico e integração produtiva.

Potencial

Segundo Parola, o ambiente institucional no Marrocos tem favorecido iniciativas de médio e longo prazo, com políticas voltadas à atração de investimentos e à ampliação de parcerias internacionais. Entre os mecanismos disponíveis estão benefícios fiscais, zonas francas e projetos em articulação com universidades e centros de pesquisa.

“O Marrocos vem se consolidando como um hub de investimentos, com base em estabilidade macroeconômica, ambiente regulatório acessível e uma ampla rede de acordos de livre comércio com mais de 50 países. Setores como agroindústria, logística, energias renováveis, construção, infraestrutura portuária, serviços digitais e o setor aeronáutico oferecem oportunidades concretas para empresas brasileiras”, afirma.

A seguir, os principais trechos da entrevista concedida com exclusividade à Revista LIDE.

Quais são, em sua visão, os setores com maior potencial para expansão dessa parceria nos próximos anos?

Nos últimos anos, testemunhamos uma intensificação expressiva das relações econômicas entre Brasil e Marrocos, impulsionada por uma agenda bilateral que privilegia a diversificação e o aprofundamento das parcerias. Setores como a agricultura e a segurança alimentar, a mineração — com destaque para os fertilizantes fosfatados — e as energias renováveis despontam como áreas prioritárias. O Marrocos tem se consolidado como referência africana em projetos solares, eólicos e, mais recentemente, em hidrogênio verde, o que abre campo para a expertise brasileira no setor.

Além disso, há oportunidades concretas nos setores de logística, digitalização, indústria farmacêutica e construção civil. A preparação do Marrocos como uma das sedes da Copa do Mundo FIFA 2030, ao lado de Espanha e Portugal, transforma o país em um vasto canteiro de obras, criando condições propícias à entrada de empresas brasileiras nos segmentos de infraestrutura, hotelaria e serviços. O turismo, que já atraiu 17 milhões de visitantes em 2024 e projeta 26 milhões até 2030, também abre espaço para investimentos em hospitalidade, formação profissional e gestão hoteleira. A complementaridade estrutural entre nossas economias oferece base sólida para que essas parcerias avancem de maneira estratégica e duradoura.

Como avalia o papel do agro nas relações bilaterais e que outros produtos ou tecnologias brasileiras têm espaço para crescer no país?

O agronegócio é, sem dúvida, um dos pilares centrais da relação bilateral. A presença consistente do Brasil no SIAM em Meknès tem refletido o reconhecimento do país como potência agroalimentar e despertado crescente interesse do setor privado marroquino em nossas tecnologias, insumos e soluções integradas.

Além da exportação de carne bovina e frango halal, há espaço significativo para a expansão de vendas de maquinário agrícola, sistemas de irrigação, bioinsumos, genética bovina e tecnologias digitais aplicadas à produção rural. O intercâmbio técnico e a cooperação científica também ganham relevância.

Em números: as exportações brasileiras do agro ao Marrocos cresceram mais de 115% nos últimos cinco anos. Apenas para dar uma ideia, a importação de gado vivo oriundo do Brasil cresceu, nos últimos dois anos, mais de 400%. O Marrocos é hoje o terceiro maior parceiro do agronegócio brasileiro na África.

A posição geoestratégica do Marrocos — como porta de entrada para a África e também para a Europa — é frequentemente destacada. Como o senhor acredita que essa vantagem pode ser melhor aproveitada pelas empresas brasileiras que desejam internacionalizar suas operações?

A localização do Marrocos é um diferencial de grande valor. Distante apenas 15 quilômetros da costa espanhola e estrategicamente situado entre Europa, África e Oriente Médio, o país permite o acesso facilitado a mercados diversos. Empresas brasileiras podem produzir localmente para reexportar com vantagens tarifárias à União Europeia, aos Estados Unidos e a diversos países africanos, em razão dos acordos de livre comércio firmados pelo Marrocos.

O porto de Tanger Med, um dos maiores e mais eficientes do mundo, oferece tempos logísticos competitivos — em muitos casos, mais rápidos do que os embarques para Roterdã. Isso representa uma oportunidade real para a inserção de produtos brasileiros em cadeias globais de valor com ganhos logísticos relevantes.

O Brasil também importa fertilizantes fosfatados do Marrocos, essenciais para nossa agricultura. Existe espaço para uma cooperação mais estratégica e duradoura nesse campo, talvez com investimentos conjuntos em pesquisa ou cadeias produtivas integradas?

Sem dúvida. O fornecimento de fertilizantes é vital para a segurança alimentar global. O Marrocos, detentor de mais de 70% das reservas mundiais de fósforo, é parceiro estratégico do Brasil, que é um dos maiores consumidores globais do insumo. A proximidade geográfica favorece o transporte e a logística, reduzindo custos e ampliando o acesso a soluções para nutrição vegetal.

A parceria ganha densidade com o envolvimento do grupo OCP e da Embrapa, que, em conjunto com a Universidade Politécnica Mohammed VI, firmaram acordo de cooperação em 2024. Esse entendimento prevê projetos de PD&I voltados à sustentabilidade agrícola, como fertilizantes inovadores, biofortificação, agricultura digital e economia circular. Inclui ainda intercâmbio acadêmico e capacitação de pesquisadores e estudantes.

O objetivo comum é avançar em direção a uma agricultura mais eficiente, sustentável e integrada às exigências do futuro.

 No campo da cultura, educação e inovação, quais projetos ou iniciativas têm contribuído para aproximar os dois países além da esfera econômica? O senhor poderia citar exemplos recentes?

A diplomacia cultural e científica tem sido fundamental na construção de uma relação mais ampla e duradoura entre Brasil e Marrocos. Temos fortalecido nossa presença em eventos culturais, intensificado a mobilidade acadêmica com bolsas e acordos interinstitucionais e promovido o intercâmbio de startups e parcerias em ciência e tecnologia.

Destaco, por exemplo, a realização da Semana Cultural Brasileira em Rabat, em 2024, com expressiva participação do público marroquino, e os avanços nas parcerias acadêmicas envolvendo universidades e centros de pesquisa de ambos os países. A cultura, a ciência e a educação são pontes sólidas, que promovem entendimento mútuo e abrem novas possibilidades de cooperação.

Por fim, que mensagem o senhor deixaria para empresários brasileiros que ainda não consideram o Marrocos como um destino estratégico para negócios e investimentos?

Minha mensagem é clara: o momento de investir no Marrocos é agora. O país combina estabilidade institucional, localização estratégica, modernização econômica e uma postura aberta ao investimento estrangeiro. Grandes projetos de infraestrutura — como o porto de Tanger Med e o trem de alta velocidade, único do continente africano — exemplificam essa vocação para a conectividade global.

A previsão de crescimento econômico robusto (3,9% em 2025 e 3,7% em 2026, segundo o FMI), a organização da Copa do Mundo de 2030 e a intensa agenda de reformas e inovação reforçam esse cenário promissor.

Desde 2023, autoridades brasileiras de alto nível têm visitado o país, incluindo o Chanceler Mauro Vieira, ministros, parlamentares e representantes do setor produtivo e judiciário. Essas visitas refletem o interesse crescente em transformar o Marrocos em um parceiro de primeira ordem para o Brasil.

Um evento da importância e alcance como este encontro de alto nível que a Lide organiza agora no Marrocos será de grande relevância para aprofundar o interesse dos investidores de ambos os lados e para dar uma dimensão cada vez mais concreta a uma amizade histórica.

Empresários encontrarão aqui um ambiente pragmático, acolhedor e alinhado com os princípios do multilateralismo e da sustentabilidade. O Marrocos é não apenas um destino estratégico, mas também uma plataforma confiável para a expansão de negócios brasileiros em direção à África, Europa e Oriente Médio. Em um momento histórico de profundas transformações, é hora de expandir horizontes, hora de investir na construção de parcerias de longo prazo.