Apesar da incerteza quanto às tarifas de Trump, projeção inicial para terceiro trimestre é de PIB estável, diz Silvia Matos
Guerra comercial dos EUA reacende temor de inflação importada e pressiona política monetária no Brasil e no exterior.
Silvia Matos, Coordenadora do Boletim Macro IBRE. (Foto: Divulgação)
O Boletim Macro IBRE de julho, divulgado nesta segunda-feira (21/7), aponta que, mesmo diante da tendência de desaceleração da atividade observada no segundo trimestre e do risco extra de choques negativos provocados pela guerra tarifária de Trump – com anúncio de aumento das tarifas de importação de produtos brasileiros para 50%, a vigorar a partir de 1º de agosto –, o desempenho recente da economia brasileira apresenta sinais ambíguos, contrabalanceado por um mercado de trabalho ainda robusto e uma política fiscal estimulativa, com “ausência de reformas estruturais dos gastos” e aumento da concessão de crédito subsidiado. Ao jornal Valor Econômico (acesso restrito a assinantes do jornal), Matos afirmou que a projeção inicial para o terceiro trimestre é de estabilidade, em que a inflação terá destaque no radar, tanto no Brasil quanto nos Estados Unidos.
No Brasil, os pesquisadores André Braz e Matheus Dias destacam que, apesar de sinais de estabilidade de preços quando observada a evolução do índice oficial em 12 meses, trata-se ainda de uma inflação disseminada – com 58% dos produtos e serviços da cesta das famílias com variações acima da meta de 3%, e 45% superando o teto de 4,5%. Além disso, destacam que o novo pacote tarifário dos EUA “reacendeu temores de desvalorização cambial e alta nos preços de comodities, como trigo e combustíveis”, persistindo o risco de uma inflação “importada”. O resultado, como destaca José Júlio Senna, é de uma mudança de ciclo de político monetária, para corte de juros, ainda longe do radar.
No caso dos Estados Unidos, além de um aumento da percepção de risco dos ativos americanos desde a aprovação do pacote fiscal de Trump, corroborando “um cenário de aumento de déficit e da dívida pública”, como destacado no Boletim, o aumento das tarifas de importação para vários países sinaliza um cenário com mais inflação. Ainda que a estratégia de Trump implique negociações e alguma redução dos níveis tarifários anunciados, a tendência é de que as tarifas fiquem em patamares mais elevados – o que, no caso das importações brasileiras, têm efeito direto e indireto. Matos destaca dados do Icomex de julho que mostram que, além de chegarem no bolso do consumidor americano – consumidor de suco de laranja, carnes e café brasileiros – a sobretaxação de Trump afeta também multinacionais dos EUA com operação no Brasil, que encaminham bens intermediários daqui para os EUA. Espera-se que esse grupo se una aos exportadores brasileiros nas negociações. “Essa pressão, se ocorrer, pode chegar no momento em que o efeito das tarifas anunciadas no começo do ano começa a aparecer na inflação americana”, disse Matos ao Valor, citando altas já identificadas em eletrodomésticos, roupas, calçados e brinquedos.
No campo doméstico, a pesquisadora do IBRE ressalta que, além do impacto que a política comercial dos EUA pode ter na atividade no Brasil e no mundo, ainda será preciso observar a possibilidade de esta suscitar uma resposta fiscal do governo para compensar setores exportadores prejudicados, o que pode tornar as perspectivas de uma correção no campo dos gastos para equilibrar as contas públicas ainda mais negativas.