Marina Silva: 'Estamos fazendo um grande esforço para proteção das florestas no mundo'
Além das relações comerciais, defesa da democracia e pauta ambiental aproximam Brasil e EUA.
Ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima do Brasil, Marina Silva. (Foto: Reprodução)
O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, anunciou que o Brasil pretende aplicar US$ 500 milhões no Fundo Amazônia nos próximos cinco anos. A informação foi divulgada durante o Fórum Virtual de Grandes Economias sobre Clima e Energia, do qual o presidente Luiz Inácio Lula da Silva também participou do encontro, em abril. O financiamento para a proteção ambiental ainda deve ser negociado pelo líder democrata americano com o Congresso.
“Pedirei os fundos para que possamos contribuir com US$ 500 milhões para o Fundo Amazônia e atividades relacionadas nos próximos cinco anos para apoiar o Brasil a eliminar o desmata-mento até 2030”, disse Biden. O documento divulgado pela Casa Branca explica que o aporte está sendo feito diante do “renovado compromisso do Brasil de acabar com o desmatamento”.
A ministra do Meio Ambiente e Mudança do Cimado Brasil, Marina Silva, disse que o aporte dos Estados Unidos para projetos de sustentabilidade no Brasil combate ao aquecimento global pode chegar a US$ 2bilhões. Segundo a ministra, o assessor do governo norte-americano para assuntos do clima, John Kerry, afirmou que a contribuição de US$ 500 milhões ao fundo Amazônia, anunciada pelo presidente dos EUA, é apenas a fase inicial de alocação de recursos.
"Estamos fazendo um grande esforço para proteção das florestas no mundo. E é fundamental que o mundo desenvolvido ajude a proteger a floresta", afirmou Marina Silva.
Por ocasião do primeiro encontro entre os Lula e Biden, que aconteceu em fevereiro, em Washington, a Amcham Brasil (American Chamber of Commerce for Brazil) – Câmara Americana de Comércio para o Brasil lançou a sua agenda de propostas para aprofundar o relacionamento bilateral. O documento “Brasil-Estados Unidos: oportunidades para uma parceria mais forte”, enviado a representantes de ambos os governos, sugere iniciativas conjuntas nas áreas de meio ambiente, cadeias produtivas e de comércio e investimentos.
Ao lado do presidente Lula, o presidente dos EUA, Joe Biden, formalizou o compromisso com o Fundo Amazônia. (Foto: Ricardo Stuckert/PR)
Além dos US$ 500 milhões para o Fundo Amazônia, o governo dos Estados Unidos irá destinar US$ 1 bilhão para reestruturação florestal na América Latina e US$ 50 milhões para reflorestamento. A partir do anúncio do presidente americano, a ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, espera que outros países sejam encorajados a contribuir para o Fundo Amazônia
"É necessário pensarem estratégias para promover produtos brasileiros de maior valor agregado no mercado norte-americano."
“O momento é oportuno para uma maior aproximação entre o Brasil e os Estados Unidos. Há considerável convergência entre ambos os governos em torno das pautas sobre meio ambiente, fortalecimento produtivo e democracia, o que oferece uma plataforma para uma parceria mais ambiciosa e estratégica”, aponta Abrão Neto, CEO da Amcham Brasil, entidade que reúne mais de 4000 empresas.
A nova embaixadora brasileira em Washington, Maria Luiza Viotti foi representante permanente do Brasil junto às Nações Unidas, em Nova York (2007-2013), Embaixadora em Berlim (2013-2016), Subsecretária-Geral da Ásia e do Pacífico (2016-2017) e Chefe de Gabinete do Secretário Geral das Nações Unidas (2017-2021).
O comércio de bens entre o Brasil e os Estados Unidos tem apresentado forte crescimento. Somente em 2022, essas trocas cresceram 25,8% e atingiram a marca histórica de US$ 88,7 bilhões, segundo dados do Monitor do Comércio da Amcham Brasil.
A relação bilateral é expressiva não apenas em valores, mas sobretudo em qualidade e diversificação. Ao todo, 79% das exportações brasileiras aos Estados Unidos em 2022 foram compostas por bens industriais. Em conjunto com o Mercosul, esse percentual é o maior entre os principais destinos de vendas do Brasil e muito acima da média do comércio do Brasil com o mundo (54%).
As exportações brasileiras para os EUA atingiram o recorde US$ 8,7 bilhões no 1º trimestre deste ano, revela análise inédita da Amcham Brasil. O Monitor do Comércio Brasil-EUA, elaborado pela entidade, indica um aumento de 9% em relação ao mesmo período do ano passado. O resultado representa quase o dobro da taxa de crescimento das exportações brasileiras para o mundo (4,8%).
Segundo Abrão Neto, “o comércio bilateral continua com um desempenho muito favorável. As exportações brasileiras seguem crescendo, na esteira do recorde registrado no ano passado. Já as importações tiveram aumentos expressivos em nove dos dez principais produtos da pauta, com a única exceção de petróleo e derivados”.
A previsão da Amcham para o ano de 2023 é que o comércio entre o Brasil e os EUA alcance valores próximos aos recordes históricos observados em 2022. “O crescimento nas exportações e nas importações tem sido disseminado em vários produtos com participação relevante na pauta, o que deve contribuir para a vitalidade do comércio bilateral”, analisa o CEO da entidade.
Em 2024, será celebrado o bicentenário das relações diplomáticas entre os dois países. Doutora e mestre pelo PPGRI San Tiago Dantas e especialista em política dos Estados Unidos, Fernanda Magnotta destaca que Brasil e EUA são as duas maiores democracias do hemisfério ocidental e possuem economias complexas, além de diversos valores compartilhados entre si. As relações bilaterais são abrangentes e institucionalizadas, com sólido histórico de cooperação.
De acordo com a também professora e coordenadora do curso de Relações Internacionais da FAAP, para além da área econômica, a defesa da democracia e a promoção de uma agenda verde também são outros importantes pontos de convergência entre os dois governos nesse momento.
Fernanda Magnotta é professora e coordenadora do curso de Relações Internacionais da FAAP e comentarista da Rádio CBN. (Foto: Divulgação)
“Questões ligadas à inclusão social, direitos trabalhistas, igualdade de gênero, equidade e justiça racial, além da proteção dos direitos das pessoas LGBTQI+ e a eliminação da discriminação étnico-racial também apareceram no ‘Comunicado Conjunto por ocasião do encontro entre os Presidentes Lula e Biden’, publicado pelas duas nações, neste ano”, aponta.
Sobre a polarização entre EUA-China, a acadêmica avalia que interessa ao Brasil, mais do que nunca, manter boas relações com os dois países, mantendo diálogo com ambos e buscando desviar de conflitos que não tenham relação direta com nossos interesses nacionais. “Uma política externa universalista e pragmática, amparada nos valores e práticas históricas de nossa diplomacia, beneficiarão o país e garantirão condições de navegar por um mundo complexo e instável”, explica.
“É necessário pensar em estratégias para promover produtos brasileiros de maior valor agregado no mercado norte-americano. O acesso do Brasil à OCDE, além da busca por redução de barreiras tarifárias e não-tarifárias, bem como o avanço nos acordos de investimentos e de não-bitributação, poderia beneficiar o avanço dessa agenda. Além disso, o fortaleci- mento da cooperação na indústria de defesa também tem espaço para aumentar o nível de interlocução entre as partes. É possível trabalhar na cooperação científico-tecnológica entre Brasil e Estados Unidos, com foco em setores como a indústria aeronáutica e espacial, aproveitando a base de Alcântara, inclusive”, analisa Fernanda Magnotta, que também é autora do livro “As ideias importam: o excepcionalismo norte-americano no alvorecer da superpotência”.
Por Fernanda Magnotta - Há pelo menos 3 agendas sensíveis com possíveis tensões entre Brasil e Estados Unidos nesse momento
1) Relação com os parceiros do BRICS, como China e Rússia;
As relações comerciais e políticas entre Brasil e China são importantes, mas também complexas. Como dois países emergentes e com grande peso na economia global, eles têm interesses diferentes e muitas vezes conflitantes com o Ocidente. Além disso, a relação com a Rússia, outro membro do BRICS, é expressiva e também pode gerar tensões com os Estados Unidos, especialmente considerando a posição do país em questões como a Guerra na Ucrânia.
2) Ingresso na OCDE e protecionismo
O Brasil tem buscado ingressar na Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) há algum tempo. No entanto, o processo tem sido lento e pode haver tensões com os EUA nas questões que envolvem protecionismo. Além disso, em geral, diversas medidas de defesa comercial têm sido praticadas pelos americanos e podem afetar produtos brasileiros.
3) Venezuela e acordos regionais na América do Sul
A crise política e econômica na Venezuela tem impacto na região e pode revelar divergências entre Brasil e EUA. Enquanto o governo norte-americano tem sido crítico ao governo de Nicolás Maduro, o governo brasileiro tem adotado uma posição considerada mais cautelosa, evitando medidas radicais. Além disso, o governo brasileiro pode enfatizar o retorno de mecanismos de liderança na América do Sul, atitude que pode incomodar os americanos, a depender do escopo e formato.
Principais modais de comércio
O Monitor da Amcham trouxe, pela primeira vez, os principais modais utilizados no comércio entre Brasil e EUA. A partir de ambos os países, a via marítima é o canal mais relevante de exportação. O modal aéreo fica em segundo lugar, tendo maior representatividade nas importações brasileiras (31,6%), sobretudo de bens de mais alto valor agregado, como medicamentos.