Fusão entre as varejistas do mercado da moda, Arezzo e Soma, acirra apreensões e questionamentos
Caberá às empresas demonstrar ao Cade que essas sinergias serão também traduzidas em eficiências ao mercado, como novos produtos e melhorias nos já existentes.
Vicente Bagnoli é Professor de Direito da Concorrência da Faculdade de Direito (FD) da Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM). (Foto: Divulgação)
A fusão entre as varejistas do mercado da moda, Arezzo e Soma, ganhou destaque recente no noticiário, afinal, estamos diante da possível consolidação do segundo maior grupo econômico do setor e, por se tratar de produtos de consumo direto pelo usuário final, acirra apreensões e questionamentos.
A preocupação com o preço é sempre presente em casos de fusões e aquisições e o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), a autoridade de concorrência que analisa e dá a palavra final nas operações, leva isso em consideração. Contudo, não se pode afirmar, sem uma análise concorrencial detalhada, que uma fusão ou aquisição deixará os produtos mais caros.
Para tanto, o Cade define qual o mercado relevante da operação, ou seja, quais os produtos, na visão do consumidor, são substitutos entre si e a área geográfica em que concorrem.
Na operação entre Arezzo e Soma, por exemplo, estamos diante de algo em torno de 34 marcas e milhares de pontos de venda espalhados pelo país. Será que essas marcas todas concorrem entre si? Quais são concorrentes? A concentração decorrente da fusão gera posição dominante da empresa no mercado?
Feitas essas análises, o Conselho avalia a possibilidade de ocorrer um pequeno, porém significativo e não transitório, aumento dos preços, e se outras empresas ofertariam seus produtos no mesmo mercado diante dessa variação nos valores, isso de modo que a concorrência não seja limitada e os consumidores prejudicados com a fusão.
Uma vez aprovada a operação pela autarquia, ocorrerá no Brasil a consolidação do segundo maior grupo varejista de moda em termos de receita. Isso demandará a análise do órgão acerca do poder de portfólio da empresa resultante da operação, ou seja, uma companhia que possui diversos tipos de marcas e produtos.
Empresas que possuem uma vasta lista de produtos e serviços podem reduzir os custos de transação de seus consumidores, que passam a lidar apenas com essa companhia ao invés de vários pequenos vendedores. Por outro lado, o poder de portfólio pode dificultar a atuação de concorrentes menores e a empresa poderia, a médio e longo prazos, utilizar dessa situação para exercer seu poder, elevando o preço de seus produtos e aumentando a sua concentração no mercado.
Em termos práticos, Arezzo e Soma devem ter considerado que as sinergias decorrentes da operação são, por exemplo, as vantagens que cada uma possui, como expertise em calçados de um lado e de vestuário do outro, como também centros de distribuições para alocar várias marcas e aumentar a distribuição, pontos comerciais espalhados pelo país e até ganhos decorrentes de despesas e receitas operacionais. Um outro aspecto a ser considerado como sinergia para as empresas é a consolidação de um grupo econômico para atrair novas marcas ao país sob a sua gestão.
Caberá às empresas demonstrar ao Cade que essas sinergias serão também traduzidas em eficiências ao mercado, como novos produtos e melhorias nos já existentes, novas marcas e tecnologias empregadas, acirramento da competição e, claro, a questão do preço ao consumidor.
O processo ainda terá um longo percurso de análises pelo Conselho de Administração que, ao final, poderá aprovar integralmente a fusão entre Arezzo e Soma, aprovar com restrições ou, até mesmo, vetar.