Competição eleitoral eleva matrículas em creches públicas
Pesquisa detectou efeito em municípios com dois turnos nas disputas pela prefeitura.
Crianças em creche municipal na cidade de Alagoinhas, na Bahia (Foto: Reprodução/Insper)
Nas cidades em que a eleição para prefeito ocorre em dois turnos, a proporção de matrículas em creches públicas supera a de municípios com características semelhantes, mas que elegem o chefe do Executivo local em apenas uma votação.
A relação entre maior competição política, de um lado, e a ampliação da oferta de bens públicos, do outro, vem se acumulando na literatura especializada. Raquel Tebaldi (pesquisadora da Universidade das Nações Unidas em Maastricht, na Holanda) e Alysson Portella (pesquisador do Insper) encontraram esse efeito para creches municipais brasileiras que acolhem crianças de até 3 anos de idade.
O estudo aproveitou-se de um corte arbitrário feito pela Constituição, que estabelece eleições em dois turnos para municípios com mais de 200 mil votantes registrados. Cidades com eleitorado abaixo dessa marca praticam o turno único.
A hipótese é que cidades pouco acima e pouco abaixo do corte não diferem entre si substancialmente. Esse gradiente de proximidade cria uma situação semelhante à de um experimento científico clássico, com cidades abaixo da marca funcionando como grupo de controle para avaliar o efeito dos dois turnos nos municípios acima dela.
Que eleições em dois turnos acirram a disputa, elevando o número de candidatos, é um fato que tem sido atestado em outros estudos sobre o tema e foi mais uma vez verificado na análise de Raquel e Alysson, que compreendeu pleitos de 1996 a 2016.
Para testar sua hipótese principal — de que esse acirramento do embate partidário, ao alargar o eleitorado necessário para a vitória, acarreta o atendimento da demanda de parcelas mais amplas e difusas da população por creches —, o estudo avaliou a taxa de matrículas e o gasto municipal em escolas para crianças até 3 anos de idade.
Nas cidades com segundo turno, a análise econométrica apurou uma cobertura do público elegível às creches três pontos percentuais acima da dos municípios logo abaixo do corte de 200 mil eleitores. Trata-se de efeito substancial, diante da média de 8% de matrículas nessa faixa etária, em que não há obrigação legal de atendimento universal.
O efeito foi exclusivo para as creches municipais públicas, o que circunscreve o impacto das eleições locais. Detectou-se também um aumento mais discreto do dispêndio dos erários municipais com creches, embora esse resultado tenha sido menos resistente aos testes de robustez do estudo.
Fonte: Insper Conhecimento