Mr. Cosmopolita: João Mansur faz de suas referências e achados o ponto de partida de seus projetos

Sofisticadamente simples e internacionalmente chique, o mais paulistano dos arquitetos, porém, nunca perdeu o sotaque e a bossa cariocas.

MANSURO mais paulistano dos arquitetos, porém, nunca perdeu o sotaque e a bossa cariocas.

João Mansur nasceu no Leblon, mas nunca foi um garoto de praia. Aos 22 anos se formou em arquitetura na primeira turma da faculdade Santa Úrsula, a pioneira das escolas privadas de nível superior do Rio. Sempre gostou mais da noite do que do dia. Circulava nos clubs privês da época, entre o Sacha’s, o Regine’s e o Le Bateau. Era onde ia a juventude dourada carioca nos anos 1970. Mansur era aquele rapaz elegante, educado, que se costuma chamar de “bem nascido”.

Mas, para além da educação, o que ele soube herdar da tradicional família de libaneses foram as referências estéticas, o olhar capaz de identificar numa casa de leilões o biombo que ficará entre os seus familiares por gerações. Ele tem o savoirfaire, o savoir-vivre com os quais chegou a São Paulo e onde fincou seu brasão leonino para tornar-se um dos arquitetos mais prestigiados da capital.

Seu estilo é autêntico e inconfundível. Uma mistura do clássico com nuances de modernidade, um suave acento oriental e algum misticismo. Uma de suas marcas registradas são as portas e os halls. Quem acompanha esse fascinante universo reconhece de cara uma porta concebida por ele: laqueadas com alto brilho, aldravas e puxadores londrinos. “Sempre tive uma forte ligação com Londres”. A porta de seu apartamento em São Paulo é um de seus objetos preferidos. Até o número, “6”, em bronze, ele trouxe da Inglaterra.

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Mistura do clássico com nuances de modernidade.

Biombos, sempre

O biombo chinês, do século XVII, é talvez uma das maiores relíquias que ele conserva. Está na família há
anos, desde que foi comprado por Mansur em Paris, em 1970, para decorar a casa do irmão. Agora faz parte da cena de entrada do apartamento do arquiteto. Não há um projeto dele em que não haja um biombo antigo, uma porta londrina e quadros do assoalho ao teto. Essa mistura bem dosada de heranças de família, garimpos de viagens e tesou- ros arrematados em leilões pelo mundo, e sobretudo suas referências, é o que faz dele um arquiteto de um refinamento cosmopolita, clássico, atemporal e atual.

Uma mostra desse apanhado de vivências, interpre- tações e bom gosto acumulado pode ser vista em sua loja, a “Sentido Cosmopolita”, no coração do Jardim América, em São Paulo. Recente- mente reformulada, a loja, instalada num charmoso casarão, exibe seus recortes de histórias feitas com mo- biliário de época, esculturas romanas, porcelanas Cia. das Índias, objetos art déco, telas e tapetes importantes, pratarias. Tudo está à venda. Menos o relógio que pertenceu a seu avô materno.

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O avô, importador de sedas, gostava de comprar arte.

Como único neto homem, ele herdou a peça em cujo centro há Mercúrio, o deus do comércio. O avô, importador de sedas, gostava de comprar arte. E foi no casarão neo- clássico da família, com interior art déco, que Mansur cresceu, admirando aquele pé direito altíssimo, sem vonta- de de ir à praia. Havia um outro mundo que ele admirava mais, sem que fosse preciso colocar os pés na areia.

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Havia um outro mundo que ele admirava mais, sem que fosse preciso colocar os pés na areia.