Lenny Niemeyer: 'estou vivendo o futuro da moda'
Quase nos 70 e prestes a se tornar avó, Lenny Niemeyer comemora 30 anos de sua marca de beachwear cheia de energia para seguir inovando.
Lenny Niemeyer: 'estou vivendo o futuro da moda'. (Foto: Arquivo Pessoal)
Às vésperas de completar 70 anos, e de se tornar avó, Lenny Niemeyer está feliz e com o olhar voltado para o futuro. O clima do apoteótico desfile que celebrou os 30 anos da marca, em novembro, no Complexo Cultural Caminho Niemeyer, em Niterói, ainda permanece na ampla sala de seu escritório, no Rio de Janeiro, onde as peças da coleção estão expostas. As três décadas como um dos principais ícones da moda praia, vêm sendo festejadas com o lançamento de uma linha de maiôs e biquínis com materiais 100% sustentáveis, a abertura de duas lojas na pandemia, uma terceira está a caminho, e com o crescimento de seu e-commerce. Uma das embaixadoras do Rio, Lenny revive histórias com modelos como Naomi Campbell e as festas memoráveis que promoveu em sua casa, onde reuniu nomes como Carolina Herrera.
O desfile que celebrou os 30 anos da marca fez um mergulho em sua história. Como foi essa viagem?
É uma coleção com um apanhado de tudo o que já fiz, mas com um olhar positivo, espiritual e futurístico. Uma verdadeira viagem. Tive muita ajuda da equipe, porque foi um ano difícil para todo mundo. Hoje tenho um time que dá um olhar mais jovem para as coleções sem perder o DNA da marca. Gosto de poder trabalhar com esse time que conhece bem a marca e que me atualiza, porque sempre estou medrosa, sempre digo que não vai dar certo.
Você fez um desfile do São Paulo Fashion Week no Rio, um fato inédito no evento. Por que essa decisão? Era muito importante que o desfile de 30 anos da marca acontecesse no Rio. O Caminho Niemey- er tinha a ver com essa arquitetura que gosto de trabalhar, de moldar o corpo das mulheres, de usar essas curvas orgânicas que o gênio do Oscar Niemeyer usava. Era um cenário pronto, com uma arquitetura maravilhosa, uma vista linda e que tinha muito a ver com a minha coleção.
Quais as principais tendências da moda praia para o verão 2022?
Uma tendência que explorei muito na coleção foi o uso das cores mais exuberantes e de formas mais orgânicas, que remetem à natureza. Outra tendência muito forte, e que parece ter vindo para ficar, é o conforto das modelagens, além de modelos que possam ser usados por corpos diversos.
A marca driblou a crise e cresceu apesar das adversi- dades. Como foi se adaptar ao novo cenário?
A gente estava preparado, já vínhamos trabalhando no e-commerce, não tivemos nenhum investimento de fora. Minha meta era manter as lojas, não dispensar nenhum funcionário e incentivar o e-commerce. Estávamos conscientes de que não havia outro jeito, senão teríamos que fechar lojas. Tivemos um crescimento fora da curva no e-commerce, 300% desde 2019, abrimos duas lojas e estamos partindo para a terceira. Para mim, o mais importante tem sido preservar meus fun- cionários, manter minha empresa funcionando, dar emprego para 350 pessoas.
Hoje sua moda tem um conceito mais sustentável. Como foi esse caminho?
Estamos olhando mais para o nosso pla neta e o caminho é esse. Esse assunto está em pauta, é necessário que estejamos engajados. Ainda não estamos preparados para ser 100% sustentável, esbarramos numa série de limitações que a gente tem que se adaptar. Mas estamos conseguin- do trabalhar com embalagens de tecido e abolindo o plástico. Estamos privilegian- do mais o artesanato local. Acho muito legal ver gente jovem despontando e tra- balhando só com materiais sustentáveis.
Como foi a experiência na parceria com a Reorder?
Adorei, foi super diferente trabalhar com resíduos de redes de pesca. Um desafio trabalhar com uma lycra diferente, mas que é 100% sustentável. É claro que eu não posso trabalhar só com preto e branco, apesar de ser uma textura que amo, estamos auxiliando para criar parce- rias de novas possibilidades também nas estamparias. Produzimos e vendemos e o consumidor final vai cobrar isso da gente.
Lenny Niemeyer: 'vivi muitas histórias com as modelos'. (Foto: Arquivo Pessoal)
Você já teve nomes como Gisele Bündchen e Naomi Campbell, entre outras, em seus desfiles. Muitas histórias?
Com certeza, vivi muitas histórias com as modelos. Com a De Von Maiochi, uma oriental que namorava o Lenny Kravitiz, pas- sei um susto. Só a conhecíamos por fotos, mas a convidamos e ela topou. No dia da chegada fui buscá-la no aeroporto e ela apareceu usando muletas. Torceu o pé enquanto passeava com o cachorro do Lenny, mas afirmou que estava ótima. Fiquei apavora- da, o desfile era no dia seguinte. Levei a um ortopedista, mas na hora do desfile ela não conseguia apoiar o pé no chão, não dava para usar salto de jeito nenhum. Como o desfile era sobre os quatro elementos da natureza, ela entrou na passarela descalça e com aquela flor no pé. Deu tudo certo e ela ficou agradecida por desfilar. Com a Naomi também tive uma experiência muito boa. Ela tinha a fama de ser uma pessoa muito reservada e difícil, eu es- tava morrendo de medo, mas na verdade ela foi um amor. Prepararam um camarim exclusivo, mas ela se recusou a ficar separada das outras meninas. Somos amigas até hoje. A Gisele é um encanto, linda e muito boazinha, sempre se mostrava igual às outras que estavam ali.
Você tem o título de Embaixadora do Rio pelas festas memoráveis que sempre fez. Como surgiu o gosto de receber?
Esse meu lado festeiro veio dos meus pais, eu cresci dessa maneira. Quando comecei a fazer os desfiles percebia que no final as pessoas iam embora, não conversavam. Comecei a fazer reuniões com a proposta de discutir os desfiles, não só os meus, mas todos da temporada. As reuniões cresceram e viraram festas. Me imprimiram esse rótulo de embaixadora, mas eu não curto. O desfile dos 30 anos foi emocionante para mim porque consegui fazer sem uma festa depois. Eu continuo festeira, só que agora as festas são mais com a família ou de trabalho, com a minha equipe.
Com certeza viveu histórias incríveis em suas festas. Pode contar algumas?
Acontecia de tudo, as coisas mais bizarras rolavam nas minhas festas. Um dia estava aconte- cendo uma para 20 pessoas, aí parou um táxi e desceram dois alemães bonitões e ficaram olhando para o meu prédio. O porteiro me avisou. Fui até lá e perguntei: ‘tudo bem? Estão procurando alguma coisa?’ Disseram que estavam procu- rando um Night Club chamado Lenny’s Home. Eu ri e expliquei que não era uma boate e sim a minha casa, que eu adorava festas e os convidei para entrar. Algumas festas eram muito grandes, eu abria a varanda, esticava a festa até a calçada. É claro que algumas histórias são impublicáveis. Em uma das festas, uma moça, no meio daquela confusão, me perguntou se eu conhecia a dona da festa. Eu ri. Ela me pediu para avisá-la se eu visse a “tal” Lenny porque ela era penetra. Eu fa lei, claro, vou procurar e te aviso. A festa mais legal que fiz foi para a Carolina Herrera. Foi tudo lindo, a decoração estavamaravilhosa. Confesso que fiquei um pouco aflita de conhecer a Carolina Herrera, mas ela foi muito relax, a pessoa mais bem educada que vi numa festa O envelhecimento nunca foi um problema para mim, não ligo para isso. De vez em quando a gente faz um botoxzinho, mas estou relax no que se refere à parte física, estou pronta para isso. Não sou e nunca fui escrava da beleza. Não tive crise dos 40, 50 ou 60 e estou passando para os 70 feliz, ain- da tenho muito para trabalhar e para fazer.
Sua filha está grávida, está preparada para ser avó?
Meu sonho na vida é ser avó, estou me sentindo a mulher mais feliz do mundo. Acho lindo ver minha filha passando por esse processo.
Você superou um aneurisma. Teve medo de morrer, o que mudou na sua vida?
Olha, eu não tive medo nenhum porque não tive tempo para isso. Estava com meu stylist e diretor de arte, o Dani Ueda, e falei que estava sentindo dor de cabeça, coisa que não tinha nunca. A minha modelista mediu a minha pressão arterial e estava em 26. Na hora pensei: estou tendo um aneurisma. Um dia depois liguei para ex-marido, Paulo Niemeyer Filho, que é neurocirurgião. Ele me disse para dar uma passada no hospital. Quando cheguei fui logo examinada, ele estava cercado de assistentes, cardiologista e me avisou que ia fazer uma ressonância. Dali fui levada direto para a cirurgia. O meu aneurisma era gigante e rompeu, mas, por um milagre, algum coágulo bloqueou a saí- da do sangue. Depois disso fiquei mais re- ligiosa, mais espiritualizada e passei a dar muito valor à vida.
Como avalia o futuro da moda e da sua marca?
O futuro da Lenny é trabalhar cada vez mais e sempre, isso é o que me move e me mantém viva. Gosto do que faço, gosto de ficar dentro do meu escritório, aqui é a minha segunda casa, é uma paixão. Então esse é o meu futuro, trabalhar até quando eu puder. Aposentadoria nem pensar. Quanto ao futuro da moda, acho que o segmento abriu portas para novos talentos, hoje eles têm oportunidades que eu não tive. A moda está en- trando num patamar diferente. As coisas andam em ondas, é uma adaptação para a qual os jovens estão muito preparados, vejo pela equipe que trabalha comigo, que tem um olhar mais moderno, que me agrega novos valores de forma inovado- ra. Estou vivendo o futuro da moda com as pessoas que me rodeiam.