‘Mesmo sem ter questões macro, o emprego formal volta a ser um driver importante do emprego no país’
Uma das implicações desse resultado, alertam os pesquisadores, é que tal redução pode significar desperdício de capacidade de crescimento da economia.
Fernando de Holanda Barbosa Filho, pesquisador do FGV IBRE. (Foto: Divulgação)
A taxa de desemprego brasileira recuou para 7,7% no trimestre móvel encerrado em setembro, conforme a PNAD Contínua divulgada ontem pelo IBGE. Em outro contexto, esse nível estaria preocupando os analistas de mercado de trabalho, que poderiam identificar uma queda maior do que aquela a que a economia brasileira conseguiria chegar sem gerar inflação.
“O fato é que a taxa de participação – porcentual da população em idade para trabalhar que se encontra em atividade ou buscando emprego – ainda se encontra abaixo do nível pré-pandemia, o que reduz essa pressão”, diz Fernando de Holanda Barbosa Filho, pesquisador do FGV IBRE.
No trimestre de dezembro de 2019 a fevereiro de 2020, a taxa de participação na força de trabalho de pessoas com 14 anos ou mais era de 63,4% do total; no trimestre encerrado e setembro deste ano, estava em 61,8%.
“Se colocássemos todas as pessoas que estavam na força de trabalho antes da pandemia de volta, e elas não conseguissem emprego, nossa taxa de desemprego ainda estaria em torno de 10%”, afirma Barbosa.“Ou seja, as condições estão mudadas, portanto comparar a taxa de desemprego atual com a do passado é como comparar uma temperatura medida em grau Celsius com outra em Fahrenheit.”
Esse é um alerta que os pesquisadores de mercado de trabalho do IBRE tem feito desde a Carta do IBRE de junho, reforçado em webinar do FGV IBRE em parceria com a Folha de S. Paulo. Observa-se que a taxa de participação, que chegou a cair para 56,7% no trimestre móvel de maio a julho de 2020, na pandemia, passou a se recuperar desde então, dando um breve soluções no terceiro trimestre de 2021, mas ganhando pontos lentamente, até chegar a 62,7% no trimestre de julho-setembro de 2022. Desde então, entretanto, o que se observou foi nova queda e estagnação em um nível inferior.
Uma das implicações desse resultado, alertam os pesquisadores, é que tal redução pode significar desperdício de capacidade de crescimento da economia. Além disso, quanto mais tempo longe da força de trabalho uma pessoa se encontra, mais complexo se torna seu reposicionamento, especialmente se consideramos que esse grupo de pessoas pode já partir de uma baixa qualificação, demandando mais investimento em capital humano.
Barbosa também ressalta que a melhora observada nesse trimestre encerrado em setembro reflete um movimento sazonal já esperado, de aquecimento da demanda por emprego em segmentos que projetam aumento de demanda nos próximos meses. O setor que registrou variação positiva na população ocupada tanto na comparação anual quanto em relação ao trimestre móvel anterior foi o de informação e comunicação (5,2% na anual e 3,5% na trimestral).
Transporte, armazenagem e correio tive aumento de 4,3% na comparação anual e estabilidade na trimestral, mesmo comportamento que o segmento de administração pública, saúde e educação, com alta de 3,9% na anual e estabilidade na trimestral. Construção, comércio e indústria registraram estabilidade em ambas as comparações. Outros serviços e agricultura tiveram queda da população ocupada de, respectivamente, 4,5% e 3,8% na comparação anual, com estabilidade na trimestral.
Um ponto positivo destacado pelo pesquisador é a manutenção da alta do emprego de carteira assinada, que no trimestre móvel encerrado em setembro cresceu 1,6% em relação ao trimestre anterior, e 3% na comparação anual, enquanto entre os sem carteira assinada e conta própria houve estabilidade. “Essa boa notícia é uma tendência que verificamos desde o ano passado, que para mim está relacionada com os efeitos da reforma trabalhista aprovada em 2018, com Michel Temer.
Na época, a economia ainda se recuperava de uma recessão, logo passamos pela pandemia, e essa série de eventos não nos permitiu capturar os efeitos das mudanças promovidas com a reforma”, afirma. Barbosa lembra que, enquanto na saída da recessão 2014-16 a recuperação do mercado de trabalho se deu predominante com a geração de vagas informais, enquanto desta vez o emprego com carteira assinada tem representado uma fatia maior das contratações.
“Agora, mesmo sem ter questões macro, como a fiscal, equacionadas, o emprego formal volta a ser um driver importante do emprego no país.”
Mesmo que em desaceleração, a evolução dos salários continua no terreno positivo. Tal como no caso da taxa de desemprego, entretanto, Barbosa tampouco considera que essa apreciação esteja em nível acima do que a economia possa acomodar hoje.
“Comparando com o observado antes da pandemia, é um valor ligeiramente acima, o que não é preocupante”, afirma. Quanto aos possíveis efeitos da volta da fórmula de reajuste do salário mínimo que permite ganhos reais, Barbosa afirma que será preciso observar. “Emprego formal é sempre positivo; a questão é saber se aumentos maiores do salário mínimo poderão gerar perda de formalização, caso o empregador entenda que trabalhadores de mais baixa qualificação estejam custando muito dada a pouca produtividade que representam”, afirma, destacando novamente desafio da agenda de qualificação de trabalhadores que o país tem adiante.