"Para os portos serem competitivos, é preciso bons acessos, pouca burocracia e harmonia entre os stakeholders", avalia Antônio Carlos Sepúlveda
O Porto de Santos, segundo o executivo, está longe de atingir esse objetivo. Ampliação da presença do setor privado na gestão dos portos brasileiros deve melhorar os níveis de serviços ao incorporar as práticas internacionais.
Antônio Carlos Sepúlveda: portos competitivos precisam de harmonia. (Foto: Divulgação)
As privatizações dos ativos da União são vistas pelo atual Governo Federal como essenciais para recuperar a economia e cobrir o déficit das contas públicas. O primeiro leilão do Porto de Santos, em São Paulo, realizado pela ANTAQ – Agência Nacional de Transportes Aquaviários – aconteceu em agosto e arrecadou R$ 505 milhões em outorgas com as concessões (por 25 anos) dos terminais de celulose do Porto de Santos. O grupo Eldorado Brasil Celulose arrematou o terminal STS14 com o lance de R$ 250 milhões e o terminal STS14A foi arrematado pelo grupo Bracell SP Celulosa Ltda por R$ R$ 255 milhões. A meta agora é privatizar efetivamente a administração do Porto de Santos já em 2021 ou no máximo em 2022.
O ministro da Infraestrutura, Tarcísio Gomes de Freitas, comemorou o sucesso do leilão.
“Estamos dando passos firmes para transformar o setor portuário e melhorar a navegação no Brasil. Somos um País que está vocacionado para crescer. A mudança não é feita pelo governo. É feita por quem move a máquina e tem vontade de transformar o país. Nós vamos ser grandes”
A expectativa é de que a privatização traga uma série de benefícios, como mais investimentos em tecnologia e equipamentos que possibilitarão a modernização dos portos, gerando mais eficiência e competitividade. “Aumentamos nosso volume de cargas importadas e exportadas, mas nada foi feito em termos de estrutura no Porto de Santos. Continuamos com os mesmos problemas de estrutura rodoviária para acesso ao porto e de dragagem, que são recorrentes e limitam a vinda de navios de maior porte ao Brasil”, relata Marcia Hashimoto, diretora executiva da Infolabor Consultoria – especializada em comércio exterior. Com a iniciativa privada na gestão do Porto de Santos, a meta é transformar o local em um hub portuário, com a habilitação para navios maiores, de até 366 metros e movimentar 40% da balança comercial.
Tarcísio Gomes de Freitas: passos firmes para transformar o setor. (Foto: Agência Brasil)
Administrado pela Santos Port Authority (SPA), vinculada ao Ministério da Infraestrutura, o Porto de Santos é um ativo crítico para o país, pois movimenta 28% da corrente de comércio brasileira. Apesar de todo o trabalho de virada operacional e financeira empreendido pela Santos Port Authority (SPA), o modelo estatal dificulta investimentos, em função de estar atrelado ao Orçamento da União e devido às exigências da legislação, que acabam estendendo os prazos para as contratações de obras e projetos. De acordo com a SPA, a empresa privada que assumir a gestão terá mais eficiência, velocidade em contratar e realizar investimentos e, portanto, tende a fazer uma melhor administração.
Modelo de negócios
A modernização dos portos começou com a aprovação da Lei 8.630/93 e, dez anos depois, com a Nova Lei dos Portos, Lei 12.815/2013, que permitiu operação com empresas privadas, tanto no porto organizado, como as instalações portuárias nele localizadas. Por isso, quando se falar hoje em privatização dos portos, se trata de uma desestatização, passando para a gestão privada, seja sob o modelo de concessão, de autorização, ou outra forma de exploração das instalações portuárias.
“Portos importantes no mundo têm suas administrações em mãos privadas (Nova Zelândia e Reino Unido) ou optaram por administrações regionais mistas, com participação de entidades privadas com entidades representativas da comunidade (Hamburgo) ou até mesmo sob a tutela do governo estadual (Port Authority of New York and New Jersey). Cada um com um modelo diferente, dependendo de condições locais e momento históricos. Não existe uma fórmula que possa ser copiada e aplicada à nossa realidade. Uma solução mista também seria aceitável sempre tendo em mente que seja uma administração independente, com auditoria independente e não pelo próprio governo e respondendo a um conselho tipo CAP ou Associação Comercial”, reflete Mark Juzwiak, diretor de relações institucionais da Hamburg Sud e Alianca Navegação e Logística.
Apesar do Brasil não ter adotado o modelo de LandLord Port, que é o mais comum, usado na Europa, segundo Murillo Barbosa, presidente da Associação de Terminais Portuários Privados (ATP), o governo trabalhará a desestatização caso a caso. “São vários modelos existentes. Esse procedimento é o mais adequado, pois analisa o que é mais conveniente para cada porto organizado. Pode ser feita, por exemplo, uma concessão da administração, ou uma privatização plena, ou até um IPO. É importante que assim seja feito, pois o Brasil é um país de dimensões continentais e cada porto organizado tem as suas especificidades, como tamanho, dimensões e número de arrendamentos diferentes para cada um deles”, diz.
Cesar Meireles, diretor presidente e CEO da Associação Brasileira de Operadores Logísticos (ABOL), que apoia a privatização das operações em todo o seu curso logístico, diz que o modelo mais indicado para uma gestão portuária é o do LandLord Port, porém, no caso do Brasil, concorda que é preciso ter soluções regionalizadas.
“Ele se traduz na infraestrutura do porto como responsabilidade do Estado, e cabe ao setor privado o fornecimento de superestrutura e realização das operações portuárias, por meio de arrendamentos (concessões) e autorizações. Ocorre que o Brasil, com particularidades e idiossincrasias regionais bastante peculiares, demanda soluções regionalizadas. Desta forma, o que pode ser bom para Santos (SP), pode não ser, necessariamente, bom para Itaqui (MA), que por sua vez, pode não ser ideal para Itajaí (SC) e por aí segue”, explica.
Para ele, quanto mais eficiente for o sistema, mais ganho de produtividade se tem, com a correspondente redução dos custos logísticos. “Quanto maior for a estabilidade regulatória, quanto mais livre o setor privado estiver para promover investimentos em suas estruturas, em seus equipamentos, em softwares, mais eficiência e competitividade estará fornecendo para a economia. É um processo de cadeia integrada”, diz.
Porto de Santos movimenta 28% da corrente de comércio brasileira. (Foto: Divulgação)
Partindo da análise de que se deve considerar as características específicas de cada localidade no processo de estudo da privatização, a diretora-executiva da Infolabor Consultoria, especializada em consultoria em comércio exterior, Marcia Hashimoto, lembra de que portos com menor movimentação e estrutura não devem ser deixados de lado. “Mesmo que não sejam tão atrativos para os investidores, devem ser considerados no lote de privatização. Portos com perfil de movimentação mais de granel tem uma estrutura de movimentação de carga diferenciada dos demais. Mas, ainda assim, requerem investimentos estruturais de acordo com o seu perfil”, diz.
Modernização
O poder de investimento em infraestrutura e de modernização feito pelas empresas privadas que já atuam nos portos é uma breve amostra do que a privatização da gestão dos portos pode trazer para melhoria do setor. A Santos Brasil, prestadora de serviços portuários e logísticos completos, referência na operação de contêineres no Brasil, já investiu mais de R$ 5 bilhões, calculados a valor presente, em aquisições, expansões, novos equipamentos e tecnologia, colaborando para aumentar a capacidade logística portuária do país. A companhia opera o Tecon Santos (SP), e mais dois terminais de contêineres – Vila do Conde (PA) e Imbituba (SC) –, um terminal de carga geral (TCG em Imbituba) e um terminal de veículos (TEV) no Porto de Santos, além de englobar a Santos Brasil Logística, que atua de forma integrada aos terminais viabilizando o atendimento ao cliente em todas as etapas da cadeia logística do porto até a porta.
Para Antônio Carlos Sepúlveda, CEO da Santos Brasil, o caminho da privatização pode ser uma das soluções possíveis para melhorar a aplicação de recursos do porto público. Porém, será preciso encontrar um modelo que garanta a harmonia entre a empresa privada que irá administrar a Autoridade Portuária privatizada e os arrendatários que já investem no porto há décadas.
“É imperativo o alinhamento dos interesses do poder concedente, dos novos gestores e dos atuais arrendatários. Sem isso a privatização não alcançará os resultados esperados”.
“No os portos serem competitivos, é preciso bons acessos, pouca burocracia e harmonia entre os stakeholders. Em Santos, estamos longe desse objetivo com o modelo atual, mas somente o fato de privatizar não garante nenhum dos três. O foco tem que ser no benefício econômico para a logística como um todo”, analisa. Além disso, outro ponto de destaque é a melhora no nível de serviço por meio do provimento de acessos marítimos e rodoferroviários compatíveis com a demanda. Para Sepúlveda, isso é um fator importante para redução de custos logísticos.