Beto Abreu: Rumo vai investir R$ 4,7 bilhões com a renovação da concessão da Malha Paulista
Tecnologia e gestão eficiente são as apostas para tornar passado o baixo investimento no transporte ferroviário.
Beto Abreu, diretor-presidente da Rumo, destaca que a empresa investirá R$ 4,7 bilhões. (Foto: Divulgação)
O Brasil possui, oficialmente, cerca de 30,6 mil quilômetros de linhas férreas. Considerando a participação das ferrovias operacionais na matriz de transporte de cargas, elas respondem por apenas 15% de todas as cargas transportadas no País. A prevalência é no transporte de minérios e carvão, que totalizam perto de 80% de tudo que é movimentado nas ferrovias brasileiras.
De acordo com o diretor do FGV Transportes, Marcus Quintella, em comparação aos países de grandes extensões territoriais, o Brasil fica em posição desfavorável, visto que os Estados Unidos possuem 225 mil quilômetros de ferrovias, a China, 192 mil, a Rússia, 87 mil, o Canadá, 78 mil, a Austrália e Argentina, 37 mil quilômetros de linhas férreas cada uma. “Se levarmos em consideração a densidade das malhas ferroviárias, ou seja, a extensão das ferrovias dividida pela área territorial (km / 103.km2), a situação piora bastante. A densidade da malha ferroviária brasileira é de apenas 3,4, contra 22,9, dos EUA e 19,9, da China”, reitera.
Nos últimos 30 anos, os investimentos públicos em infraestrutura de transportes permaneceram abaixo de 0,20% do PIB nacional, sendo que em ferrovias, praticamente nada de relevante foi realizado, aponta Quintella. Segundo ele, as melhores estimativas mostram que o Brasil precisaria investir em infraestrutura de transportes, algo em torno de 5% ao ano do PIB nacional, durante 25 anos, para se tornar competitivo internacionalmente. “Concomitantemente, a iniciativa privada poderia contribuir bastante, investindo em projetos atraentes e participando da manutenção da infraestrutura. O país precisaria, ainda, resolver os gravíssimos problemas dos entraves relacionados à insegurança jurídica, dos marcos regulatórios pouco consistentes, das divergências tributárias e da definição de uma matriz de riscos que seja atrativa para os investidores”, considera.
Papel da iniciativa privada será essencial paramelhorarmos nossa malha ferroviária. (Foto: Divulgação)
Movimentação e crescimento
Embora na opinião de Quintella seja difícil fazer projeções, visto que para tanto depende do cenário econômico mundial, principalmente em relação às exportações de minério de ferro e grãos para os mercados europeu e asiático, bem como para os EUA, e pelo fato de que o Brasil passa por dificuldades políticas e econômicas internas, ele estima que a safra agrícola volte a apresentar os excelentes resultados de 2019/2020 e que os consumos doméstico e internacional voltem aos níveis anteriores à pandemia do Covid-19. “A ferrovia precisa ser expandida e diversificada em sua atuação para que possa reequilibrar a matriz de transporte de carga brasileira, no mínimo, com 30% de participação, com o aumento da movimentação de grãos, fertilizantes, combustíveis, insumos da construção civil, contêineres, produtos siderúrgicos e veículos, além de minérios e carvão”.
Neste cenário, Beto Abreu, diretor-presidente da Rumo, destaca a continuidade dos recordes na safra de grãos produzidos no Brasil e ressalta que o País desempenha papel fundamental no trade global de grãos, com 37% em 2019. “Foram quatro recordes nos últimos cinco anos, talvez com exceção de 2016, e a expectativa é de crescimento em 2020, quando a estimativa de produção é de 225 milhões de toneladas”, registra.
A Rumo investirá R$ 4,7 bilhões com a renovação da concessão da Malha Paulista, que junto com a Malha Norte responde pelo escoamento de grande parte da produção agrícola de Mato Grosso até o Porto de Santos. Este contrato de renovação antecipado da concessão da Malha Paulista com a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) foi assinado em maio último, o que Abreu considera como um marco na infraestrutura por ser a primeira entre as concessões ferroviárias. “Com ela, deixamos um legado técnico e estrutural de referência para o desenvolvimento do modal ferroviário daqui em diante. Foram quatro anos de estudos técnicos e ajustes nos planos de negócios, um trabalho robusto e de alta complexidade, discutido em consultas públicas e audiências acompanhadas pelo Ministério Público Federal e pelo Tribunal de Contas da União - TCU. Acredito que a sinergia entre as ações do Ministério da Infraestrutura e da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), em conjunto com a iniciativa privada é essencial para o futuro das ferrovias”, calcula.
Com relação especificamente à Malha Paulista, serão mais de R$ 6 bilhões investidos ao longo da concessão, prorrogada até 2058. O executivo afirma que, atualmente, ela forma o principal corredor de exportação do agronegócio brasileiro, isso junto com a Malha Norte. “Essas duas malhas conectam a cadeia produtiva do Centro-Oeste do País ao Porto de Santos. Com as obras previstas, vamos ter uma expansão de capacidade de 35 milhões para 75 milhões de toneladas por ano. Logo, estamos falando em mais que dobrar a capacidade atual. Hoje, em termos de produtos, podemos dizer que a Malha Paulista já é a ferrovia mais diversificada do País. Além de soja, farelo de soja, milho e açúcar, circulam combustíveis, fertilizantes, celulose, minérios e contêineres. Com o aumento da capacidade da Malha Paulista fortalecendo a conexão com o Mato Grosso via Malha Norte e a conclusão das obras e início da operação da Malha Central, aumentaremos tanto a quantidade quanto a diversidade de produtos em circulação”, detalha.
A companhia que tem sua base de ativos formada por mais de mil locomotivas e 28 mil vagões, e opera 12 terminais de transbordo, seis terminais portuários e administra cerca de 14 mil quilômetros de ferrovias nos estados de Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, São Paulo, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Minas Gerais, Goiás e Tocantins, também conta com uma área dedicada à inovação de produtos e serviços, que conta com um orçamento anual destinado à pesquisa e desenvolvimento. Só em 2019 o investimento foi de R$ 329 milhões.
MRS indica os ganhos em eficiência da gestão privada. (Foto: Divulgação)
Nível tecnológico
Atualmente, a MRS Logística, que é reconhecida internacionalmente por sua operação sofisticada, transporta 30% de toda carga movimentada pelo modal ferroviário no Brasil e cerca de 20% das exportações brasileiras passam pelos seus trilhos. Esses números, segundo Guilherme Mello, presidente da empresa, indicam os ganhos em eficiência que a gestão privada permitiu atingir ao longo desses anos. “Nos últimos tempos, o setor ferroviário de cargas vem passando por um processo de renovação antecipada das concessões. Cada empresa conduz o seu próprio processo, que é coordenado pela ANTT e pelo Ministério de Infraestrutura. As empresas desenvolvem planos de negócios, que são avaliados por esses dois órgãos e, posteriormente, pelo TCU. A renovação antecipada das concessões vai ampliar a participação do modal ferroviário no transporte de cargas no Brasil”, informa.
Os investimentos na renovação da concessão da companhia podem superar R$ 7,5 bilhões até 2056. De acordo com Mello, os investimentos previstos pela MRS com a renovação da sua concessão têm dois norteadores principais: aumentar a capacidade e a eficiência da operação ferroviária, promovendo a integração logística da região sudeste; e mitigar conflitos urbanos. “Isto é, construir aparelhos urbanos como viadutos, passarelas, melhorias em passagens em nível com objetivo de oferecer mais segurança às populações de regiões por onde passa a nossa ferrovia”, explica.
Especificamente para a Região Metropolitana de São Paulo, a companhia prevê a segregação entre os trens de carga e de passageiros por meio da construção de uma nova linha exclusiva para a operação de carga, liberando as atuais linhas compartilhadas para operação de passageiros. “Vamos aproveitar a oportunidade para reservar parte da faixa de domínio para o Trem Intercidades, além de criarmos dois novos Polos Intermodais - Mooca e Lapa, que, certamente, irão desafogar o trânsito da cidade e das rodovias, por permitirem que a carga chegue diretamente dentro da cidade por meio da ferrovia, para ser distribuída por Veículos Urbanos de Carga, os VUCs”, detalha.
No comparativo com a infraestrutura da malha ferroviária internacional, o executivo avalia o setor ferroviário brasileiro como bem desenvolvido e ressalta que, em sua operação, incorpora elevados níveis de tecnologia, com conhecimento técnico e mão de obra de qualidade. “Em geral, nos trechos em operação, os ganhos em aumento de volume e redução de acidentes nos últimos anos é significativo”, comemora.
Em termos de investimentos em inovação para os próximos anos, Mello considera que a perspectiva seja ampliar a implantação da tecnologia no setor, com a intensificação do uso do conceito de Indústria 4.0 e aprimoramento de sistemas remotos de acompanhamento de cargas. “Teremos, por exemplo, investimentos obrigatórios em inovação nos próximos anos, entre outras iniciativas para potencializarmos ainda mais os ganhos que a ferrovia pode oferecer. Uma outra tendência que vai se fortalecer é a formação de parcerias multimodais. Elas permitirão incrementos dos volumes transportados pela ferrovia, trarão ganhos de eficiência à operação e melhores serviços de logística para o setor produtivo”, acredita.
Em 1996, quando a MRS Logística foi criada e assumiu a gestão da Malha Regional Sudeste - Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo, a companhia contava com 401 locomotivas e 11 mil vagões e operava por 1.167 km. Ao final de 2019, esses números totalizaram 730 locomotivas, 18 mil vagões e 1.643 km de trilhos operacionais.