Treinamento, genética e investimentos: o que molda o corpo de um atleta olímpico?
Valmor Tricolli afirma formação de um atleta de ponta envolve uma série de fatores complexos e que a interação de uma carga genética favorável com o ambiente de treinamentos do esportista é crucial.
Segundo especialista, o corpo de atleta depende de aspectos genéticos e tem definitivamente características do meio ambiente.(Foto: Freepik)
A galeria dos jogos olímpicos está cheia de registros de feitos históricos nos esportes. Os atletas se preparam durante toda a vida para quebrar as barreiras do corpo humano e superar seus limites nos mínimos detalhes. Correr 100 metros rasos em 9.63s, nadar 100 metros em 47.02 segundos, realizar um salto de 8.90 metros e entre outras marcas assustadoras, a reunião dos maiores atletas do mundo desafia os limites humanos a cada edição.
Corpo de atleta
A dedicação dos atletas é evidenciada pelo próprio corpo. Em cada modalidade de competição, o formato e as características corporais dos esportistas seguem uma tendência. Na natação, ombros largos, braços fortes, costas bem desenvolvidas. Entre os corredores, velocistas exibem o corpo bem definido e tonificado, enquanto os maratonistas são mais magros e têm rostos mais afinados. Ginastas de estatura pequena, com as pernas musculosas e abdômen definido. Cada esporte evidencia as características que são mais adaptadas para sua prática.
Dentro desse universo do esporte de alto rendimento, a formação de um atleta envolve uma série de fatores complexos. De certo, a prática esportiva molda os atletas ao longo do tempo. O treinamento intenso, a rotina de preparação física, a alimentação regrada e o sono bem ajustado são fatores fundamentais. O investimento financeiro em uma equipe de preparação capacitada, métodos de treinamento mais eficientes e equipamentos de ponta para auxiliar na evolução do atleta também é essencial. Outro fator importante, é a genética do atleta, visto que cada esporte requer características específicas, os que indivíduos que apresentarem facilidades no desenvolvimento desses aspectos tem mais chances de se destacar no esporte.
Combinação de fatores
Para entender melhor esses aspectos, conversamos com o professor Valmor Tricoli, da Escola de Educação Física e Esporte da USP. “O desempenho esportivo é muito complexo, envolve uma combinação de fatores muito grande. Isso inclusive gera uma dificuldade de controle do desenvolvimento do atleta, porque ele é multifatorial. Então tem os aspectos genéticos e tem definitivamente características do meio ambiente. No meio ambiente, o que a gente pode destacar é o processo de treinamento. Já faz alguns bons anos que tem outro aspecto do meio ambiente que é o avanço tecnológico tanto no processo de Treinamento como nos equipamentos que você usa para treinar que vem impactando nos resultados dos esportes. Então muito se modificou em desempenho, recordes e assim por diante. Não somente pelo avanço do desempenho físico do indivíduo, mas pelo avanço tecnológico também”, detalha.
O professor destaca a importância de uma carga genética favorável. “Ter uma carga genética privilegiada significa que você responde bem a um determinado processo de treinamento. Você é sensível ao processo daquele treinamento físico. Isso acaba influenciando o seu meio também. Se você responde bem ao treinamento, você tende a ter uma adesão maior ao processo, você gosta mais de treinar e acaba tendo um envolvimento maior. Isso gera mais dedicação, pois você se sente mais recompensado naquela modalidade, é mais prazeroso se esforçar quando você vê resultados positivos. Então tudo isso é um conjunto da interação da genética com o meio ambiente que permite o indivíduo ter um desempenho melhor na sua modalidade”, explica.
Genética
“O esporte e a prática ajudam no desenvolvimento do atleta, mas existe ali uma espécie de seleção natural para os atletas de ponta. A carga genética vai se manifestar na média dos atletas de cada modalidade porque eles naturalmente se destacam. Não é atoa que atletas do basquete ou vôlei são mais altos que a média, ou que os atletas de atletismo no arremesso de peso são mais fortes que a média. Claro, é evidente que o corpo se adapta a um processo longo de treinamento, 10 anos fazendo a modalidade vão ter impactos no corpo. Mas não é que a modalidade, necessariamente, tornou o indivíduo mais alto mais baixo, isso tem um fator genético de muita importância. Muitas vezes, os pais das crianças acreditam que se matricularem seus filhos no basquete, por exemplo, eles vão crescer e ficar mais altos, ou que se colocarem eles para praticar lutas, eles serão necessariamente mais baixos. Isso não é verdade, existe ali uma predisposição genética, o esporte apenas vai auxiliar o processo” complementa.
Além da carga, o tempo e a intensidade de treinamento também são de extrema relevância. “Um fator crucial é a carga de treino acumulada ao longo de anos. No universo de atletas de alto desempenho, a média nos mostra que o histórico desses indivíduos é que eles acumulam esforços por muito tempo até chegarem nos seus resultados. Não há uma idade certa para começar, tem modalidades esportivas em que o desempenho é caracteristicamente mais precoce, os competidores começam muito novos. Outros, você vê atletas de 30 anos, que já é uma idade avançada para o mundo esportivo, desempenhando ainda muito bem. Mas dificilmente um competidor com 3 ou 4 anos de treino chega no nível do alto rendimento, isso é muito raro. O normal é ter um histórico longo por trás dos atletas”.
As oportunidades no início da carreira são de extrema importância. Um atleta que recebe a atenção devida logo cedo e tem o suporte necessário para se desenvolver leva uma vantagem competitiva para o resto de sua trajetória. A relação entre pódio olímpico e investimento público nos esportes é evidente. Em 2021, a Sports Value, empresa especializada em marketing esportivo, concluiu que o investimento realizado pelos países para sediar as Olimpíadas impacta diretamente no desempenho das equipes nacionais, que normalmente alcançam resultados melhores nos jogos. Países como Espanha, Austrália, Coreia do Sul e o próprio Brasil se posicionaram melhor nos quadros de medalha após esses investimentos.