Mulheres correspondem a 1 em cada 4 profissionais de tecnologia no Brasil
Crenças culturais, preconceitos e falta de representatividade no mercado são alguns dos motivos mapeados. Por meio de mentorias e cursos gratuitos, instituições atuam para diminuir a disparidade em todo o país
Crenças culturais, preconceitos e falta de representatividade no mercado são alguns dos motivos mapeados. Por meio de mentorias e cursos gratuitos, instituições atuam para diminuir a disparidade em todo o país (Foto: Unsplash)
Facilidade de aprendizado, excelentes notas e a expectativa de uma carreira promissora. Muitas meninas, ainda em fase escolar, apresentam uma grande aptidão para lidar com as disciplinas que envolvem tecnologia, ciências, engenharia e matemática e às vezes nem compreendem essa habilidade, por nunca terem sido incentivadas.
Ao longo da vida e por diversos motivos (crenças culturais enraizadas de que isso “não é coisa de menina”, preconceitos e falta de representatividade no mercado, por exemplo), acabam sendo desencorajadas a atuarem nessas áreas, passando a representar apenas 23,6% da força de trabalho na área de tecnologia, em comparação aos homens, que são 76,4%, como aponta pesquisa realizada pela Catho. Para diminuir esse gap entre homens e mulheres no mercado de STEM (em inglês, ciências, tecnologia, engenharias e matemática), algumas instituições têm desenvolvido trabalhos voluntários para estimular meninas e mulheres a seguirem seus caminhos e brilharem na vida profissional.
Vieses inconscientes e preconceitos enraizados desde a infância. Segundo Renata Malheiros, co-founder do Instituto Alumna, organização sem fins lucrativos que desenvolve programas de mentoria para mulheres, esses são alguns dos motivos responsáveis pela discrepância entre mulheres e homens no mercado de STEM. “Infelizmente, é muito comum escutarmos, quando meninas, que somos melhores em matérias de humanas e os meninos em exatas. Isso é colocado na cabeça das crianças desde cedo e acaba influenciando comportamentos e escolhas”, acredita.
De acordo com um relatório da UNESCO, realizado em parceria com o British Council, estima-se que apenas uma mulher para cada quatro homens consiga um emprego na área de STEM na América Latina. A organização aponta que as disparidades de gênero na ciência contribuem significativamente com a desigualdade econômica na sociedade.
Já a pesquisa Girls' Attitudes Survey, realizada em 2020 pela Girl Guiding, mostra que os estereótipos de gênero desempenham um papel enorme na inibição de mulheres em atingirem seu potencial. O estudo aponta que 41% das jovens com idades entre os 11 e 21 anos ainda acreditam que existem profissões e carreiras que as pessoas esperam que elas sigam simplesmente por serem mulheres.
Renata explica que mesmo aquelas meninas que caminham na contramão dessa cultura enraizada e decidem ingressar nessas áreas profissionais, enfrentam preconceitos desde a faculdade até o mercado de trabalho. Para mudar esse cenário, a Alumna atua por meio de um programa de mentoria, conectando mulheres em início de carreira, prioritariamente negras, que fazem parte da primeira geração da família na universidade ou de baixa renda, a profissionais experientes no mercado de trabalho.
“Nós atuamos promovendo a representatividade, acreditamos que é preciso ver gente como a gente para poder sonhar em estar naquele lugar. Quando a Alumna conecta uma estudante da área de STEM com uma profissional sênior, ela tem mais chances de sonhar a si mesma naquela posição e aprender caminhos para superar as barreiras adicionais que são colocadas pela nossa cultura, como os preconceitos”, explica Renata.
Finalista do "Prêmio Movimento LED", que reconheceu 15 iniciativas que inovaram a educação no Brasil, a Alumna oferece mentorias 100% online e gratuitas. Recentemente, a oitava turma aberta foi voltada para o mercado de STEM, o objetivo foi estimular mulheres a ocuparem ainda mais esses espaços na área de exatas. O programa dura seis meses e conta com encontros virtuais de uma 1hr por mês. Uma nova turma será aberta em novembro e abrangerá outras áreas do conhecimento.
“Poucas meninas têm a oportunidade de brincar com jogos de construção e ter acesso ao computador, como seus irmãos ou primos. Desde muito novas, crianças discriminam as profissões como sendo uma profissão feminina ou masculina. A falta de referência e inspiração feminina no setor de STEM também limita as meninas a se projetar e sonhar ser astronauta, programadora, engenheira e cientista”, afirma Corinne Giely, presidente no Brasil da ONG Inspiring Girls.
Entre as ações promovidas pela organização estão sessões inspiradoras presenciais ou híbridas com alunas de escolas públicasde 9 a 15 anos, em parceria com as colaboradoras de empresas de tech e engenharia. “A ideia é ampliar o horizonte profissional das alunas. Além disso, a Inspiring Girls promove cursos de desenvolvimento de soft e tech skills patrocinados pelas empresas parceiras e constrói uma ponte entre as alunas de escolas públicas e os programas de jovem aprendiz dessas empresas patrocinadoras”, explica Corinne. A ONG foi fundada na Inglaterra e hoje já está presente em 31 países.
Para Renata, da Alumna, a expectativa para o futuro é de um mercado mais equilibrado, tanto do ponto de vista de gênero quanto de diversidade. “ A gente sabe que é na diversidade que encontramos inovação. Ciência, matemática, tecnologia e engenharia fazem parte de um mundo muito impulsionado por inovações, a gente precisa de mais diversidade de pessoas nesses ambientes, pois assim teremos mais ideias criativas, mais pontos de vista e mais possibilidades de resolução de problemas de toda nossa sociedade”, concluiu.