“O envolvimento com a atividade física não é só uma decisão pessoal”, afirma Douglas Roque Andrade
Um dos profissionais por trás do Guia de Atividade Física para a População Brasileira, Douglas Roque Andrade traz os desafios para enfrentarmos o sedentarismo no país
Douglas Roque Andrade, pesquisador do comitê científico. (Foto: Marcos Santos/USP Imagens)
Lançado recentemente pelo Ministério da Saúde, o novo Guia de Atividade Física para a População Brasileira não se resume a fazer orientações gerais para diferentes públicos. O documento valoriza o deslocamento ativo, as tarefas domésticas e especialmente a necessidade de as autoridades contemplarem determinantes sociais que interferem nas taxas de sedentarismo.
A Agência Einstein conversou com Douglas Roque Andrade, profissional de educação física e um dos pesquisadores do comitê científico que elaborou essas diretrizes. Na entrevista, ele apresenta o cenário da atividade física no Brasil, os efeitos da desigualdade no sedentarismo e quais passos precisamos dar para tornar nossa população mais ativa.
Qual é a importância do Guia de Atividade Física para a População Brasileira?
Douglas Roque Andrade: As mortes relacionadas à inatividade física no Brasil somam 11,6%, um índice maior que a média mundial, que é de 9%. Segundo o Observatório Global de Atividade Física, 53% da população brasileira é praticante, com maior prevalência para os homens [60%] em relação às mulheres [47%] e para a faixa socioeconômica mais alta. Nesse contexto, o guia se transforma em um potente instrumento de educação em saúde a diferentes públicos.
O guia também discute determinantes sociais que influenciam na prática de atividade física, certo?
Sim. Basicamente, o gênero, o nível socioeconômico, a raça e, claro, o local de residência podem determinar o envolvimento com a atividade física. Em um país tão desigual quanto o nosso, algumas pessoas terão menos acesso aos serviços ofertados pelo poder público e privado. Se considerarmos que o lazer é a oportunidade em que o indivíduo tem maior liberdade de escolha, é justamente nessa dimensão que os determinantes sociais para a prática de atividade física se fazem mais presentes.
Há meios de melhorar esse cenário?
O poder público pode criar mais oportunidades de envolvimento da população com a atividade física por meio do acesso a parques públicos de qualidade, por exemplo. Ou pela conexão entre o transporte público e o deslocamento ativo, seja a pé ou de bicicleta.
Outro destaque do guia é a importância da educação física escolar. Até que ponto a escola pode influenciar na formação de um adulto ativo?
Nossos comportamentos dizem respeito a experiências acumuladas, que podem impactar positivamente ou negativamente na jornada de uma vida ativa. O envolvimento com a atividade física não é só uma decisão pessoal, ele é mediado pela nossa relação com vários fatores ambientais, seja um ambiente construído ou natural. Então a educação física escolar precisa ser mais bem qualificada em todo o território nacional. Ela também deveria atender minimamente três aulas de 50 minutos cada por semana.
O guia apresenta recomendações para pessoas com deficiência. As cidades brasileiras estão preparadas para garantir a locomoção e a oferta de serviço a esse público?
Se a cidade não é segura para que crianças, idosos ou pessoas com mobilidade reduzida possam caminhar sem a preocupação de tropeçar em algum buraco na calçada, ela não está preparada para ser acolhedora. Uma sociedade que depende sempre do transporte via carro é mais segregadora. Precisamos de espaços de aprendizagem, de experiências positivas e de locais para estar, não somente para passar.
(Fonte: Agência Einstein)