Redes sociais perderiam R$ 23 bilhões em valor de mercado com mudança de regra

A estimativa é de um estudo do Insper que avaliou a perda das plataformas em caso de alteração do regime de responsabilidade civil aplicado às plataformas na moderação das postagens.

O relatório foi elaborado pelo Centro de Regulação e Democracia e debatido em evento no Insper. (Foto: Reprodução/Agência Brasil)

A alteração do regime de responsabilidade civil aplicado às redes sociais provocaria, para essas empresas, perda de receita estimada em ao menos 47 milhões de reais por ano e de valor de mercado de 23 bilhões de reais no Brasil. Os consumidores ou usuários também seriam atingidos, com perda de até 4 bilhões de reais. A discussão sobre a constitucionalidade do artigo 19 do Marco Civil da Internet chegou ao STF (Supremo Tribunal Federal) e pode retirar a garantia de decisão judicial antes da configuração de responsabilidade das redes por conteúdo de usuários.

Os números citados fazem parte do estudo “Estimativa do Impacto Econômico da Responsabilidade Objetiva de Plataformas Digitais por Conteúdo de Terceiros”, elaborado pelo Centro de Regulação e Democracia e debatido em evento no Insper. O cálculo levou em consideração os dados de faturamento no Brasil de redes sociais como Facebook, Instagram e YouTube.

O artigo 19 do Marco Civil da Internet determina que o provedor de aplicações de internet, como as redes sociais, somente pode ser responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros se, após ordem judicial específica, não tomar as providências para tornar indisponível o conteúdo apontado como infringente na decisão. “O argumento que defende a inconstitucionalidade desse artigo é que há uma deficiência de proteção das vítimas de manifestações ilegais, como ataque à honra e ao racismo. Para essa corrente, as vítimas não estão sendo protegidas da forma que a Constituição Federal determina, inclusive em relação à celeridade”, disse Ivar Hartmann, professor de Direito do Insper e um dos autores do estudo.

Antes do Marco Civil da Internet, por força de consolidação jurisprudencial do STJ (Superior Tribunal de Justiça), bastava uma notificação extrajudicial, exigindo a remoção do conteúdo, para que a rede social fosse obrigada a proceder dessa forma. “Uma vez notificada, se ela não removesse a manifestação, poderia ser condenada a indenizar a vítima de forma solidária com o autor da manifestação”, explicou Hartmann. “É justamente esse cenário que pode ser retomado pelo STF. O julgamento deve ocorrer no primeiro semestre do ano que vem. Nosso estudo mensurou quais seriam os impactos dessa decisão”, completou o professor.

Liberdade de expressão

Por trás de toda essa discussão está a liberdade de expressão. A moderação de conteúdo online se divide entre manifestações ilegais e manifestações — ilegais ou não — que violam os termos de uso das plataformas. Em qualquer uma dessas frentes, há falsos positivos, ou seja, manifestações que, na realidade, não violam as regras da legislação ou das plataformas, mas que, ainda assim, são removidas, com a conta do usuário podendo ser suspensa ou banida. É aqui que reside parte das perdas para o consumidor ou usuário calculadas em até 4 bilhões de reais. É o valor que o usuário médio atribui ao uso de redes sociais para acessar informações, opiniões e entretenimento. Além disso, a suspensão ou o banimento de contas ou páginas traz prejuízos, por exemplo, para empresas e influenciadores que utilizam as redes sociais como plataformas de negócio.

Com a mudança da responsabilização civil, em caso de inconstitucionalidade do artigo 19, a tendência, ainda segundo o estudo, é que cresça o número de falsos positivos, afetando a segurança jurídica de quem se manifesta nas redes sociais e das próprias plataformas que viabilizam os espaços de manifestação. “O efeito econômico negativo é muito relevante de uma medida que, ao invés de permitir que o Brasil avance em termos de eficiência, representará um retrocesso”, avaliou Paulo Ribeiro, professor de Economia do Insper, que também participou da elaboração do trabalho. “Esse foi o primeiro estudo que estimou os efeitos econômicos da responsabilidade objetiva das redes sociais”.

A professora Luciana Yeung, coordenadora do curso de Ciências Econômicas do Insper, destacou que, quando existe uma regulação, a sociedade como um todo é impactada, não apenas o regulado, mas os consumidores, o próprio Estado e grupos de interesse. “Nesse caso específico, são as pessoas que se sentem ofendidas com determinado conteúdo, as que têm seus conteúdos ou perfis retirados, as plataformas de redes sociais e o Estado. O estudo é bem-sucedido ao mostrar todas essas facetas, oferecendo análise equilibrada e detalhada”, afirmou.

Para Silvia Fagá de Almeida, diretora da área de concorrência da LCA Consultores, as redes sociais perceberam que conteúdos polêmicos podem ser positivos em termos de aumento do engajamento e da interação, cujos índices vêm caindo com o passar dos anos. “No momento em que a plataforma vai vender anúncio, esses dados são relevantes para convencer o anunciante a fazer o investimento. Por isso, discordo do estudo nesse ponto, que disse haver incentivos próprios do mercado para que as plataformas retirem do ar conteúdo de má qualidade ou inapropriado por ser ruim para o usuário”, disse.

 

Fonte: Insper Conhecimento