Leila Oliveira, da Warner: 'Papel de uma gravadora deve ir além do lançamento de músicas e construir a trajetória profissional de um artista''
No mundo dos streamings, presidente da Warner no Brasil destacou o papel das novas tecnologias no crescimento do mercado fonográfico.
Leila Oliveira, presidente da Warner Music Brasil. (Foto: Divulgação)
Se houve um dia em que os rankings mundiais de músicas eram dominados por repertório de origem anglo, hoje, essas listas também dão espaço para músicas latinas, africanas e colaborações de diversas regiões do mundo.
A expansão dos streamings e o avanço de novas tecnologias permitem o surgimento de novos artistas e facilitam o acesso ao novo. É o que explica Leila Oliveira, presidente da Warner Music Brasil, em entrevista exclusiva ao LÍDER.INC. A executiva falou, ainda, sobre o atual momento da indústria fonográfica e compartilhou suas visões sobre o futuro.
Leila, o mercado da música celebrou quando você assumiu a presidência da Warner, em setembro de 2022, especialmente por ter sido a primeira mulher a assumir esse posto em uma gravadora multinacional no Brasil. Como você analisa as oportunidades para mulheres nesse mercado?
Antes de assumir a presidência da Warner Music Brasil, eu acreditava ter noção da importância que teria exercer esse cargo sendo uma mulher. Estar em grandes empresas é uma tarefa difícil, principalmente em um país como o nosso, e eu sempre acreditei que a representatividade seria sinônimo de mudança. Porém, a ficha realmente caiu quando no dia a dia eu pude perceber o tamanho da responsabilidade de criar, na rotina, ações inclusivas que possam perdurar nessa estrutura.
Entendo também que os desafios da mulher no mercado fonográfico são parecidos com os desafios da mulher em qualquer área de atuação: casos de desigualdade de salários, assédio, descrédito como autoridade, etc. Só que, diferente de muitas outras carreiras, fico feliz em já podermos falar de algumas conquistas do nosso segmento. Como trabalhamos com música e cultura, temos que fazer com que a liberdade e o respeito desse universo prevaleçam também na sua estrutura por trás dos holofotes. Trago um exemplo de dentro de casa - 54% da nossa equipe interna é formada por mulheres. E na parte artística temos o orgulho de trabalhar com inúmeras vozes femininas - algumas dentro de gêneros majoritariamente masculinos como Marvvila no pagode, e Azzy no rap - e outras que hoje são referências para as novas gerações, como IZA e Ludmilla.
Como você definiria o atual momento do mercado brasileiro e internacional da música?
O mercado de música segue em ampla expansão pelo sétimo ano consecutivo, impulsionado principalmente pelos streamings. Inclusive, temos o Brasil em 9ª lugar no ranking fonográfico do último ano. Globalmente estamos em um momento extremamente importante, com uma ascensão muito maior de músicas de várias partes do mundo. Se antes os charts globais eram predominantemente de repertório anglo, hoje vemos uma presença muito grande de músicas latinas, africanas, colaborações com artistas indianos e por aí vai.
No Brasil também tivemos um crescimento no consumo digital fora do eixo Rio-São Paulo. Hoje o nordeste e o centro-oeste tem uma representatividade muito grande, não apenas artística, mas também enquanto audiência.
O streaming ajuda a impulsionar o mercado fonográfico, mas a cada dia aumenta a concorrência de artistas a serem ouvidos. Qual é o papel das gravadoras nesse cenário?
Nosso papel foi realmente se adaptando a essa nova dinâmica de mercado. Não apenas pela quantidade maior de conteúdo que é disponibilizada a cada dia, mas também pelas diferentes necessidades de cada artista. Nosso papel é agregar valor e isso pode ir desde um serviço mais básico de distribuição, até uma construção total de carreira. Temos uma estrutura que traz todo um suporte global, mas ao mesmo tempo aprendemos a trabalhar com flexibilidade. Enquanto carreira, entendo que cada vez mais o papel de uma gravadora deve ir além do lançamento de músicas e construir a trajetória profissional de um artista como um todo. Hoje a identidade e a narrativa desses artistas é fundamental, e é maravilhoso pensar que nosso trabalho também acaba envolvendo uma potencialização cultural e o fortalecimento desse propósito. Precisamos buscar mais oportunidades de negócios, valorizando ainda mais as fanbases, para que tenhamos produtos mais trabalhados e assertivos. Os profissionais estão cada vez mais buscando esses caminhos, adaptando estratégias e indo atrás do que virá a seguir.
Quais são os maiores desafios da gestão nesse mercado?
Acho que uma das coisas mais estimulantes desse mercado é justamente a forma como tudo vem evoluindo nos últimos 10, 12 anos… E na maioria das vezes os grandes desafios se transformaram em enormes oportunidades. Foi assim com o streaming (hoje a maior forma de consumo) e com os conteúdos gerados por usuários, por exemplo. Creio que o maior desafio é entender essas constantes mudanças, adaptar modelos de negócios e ter equipes estratégicas e capazes de antecipar, planejar, executar e atingir nossos objetivos.
Qual é o atual momento mercadológico da WMB?
Adotamos novos modelos de negócios e recentemente inauguramos o Warner Music Space, com uma variedade de zonas criativas, estúdios, lounges, arena e palco para apresentações acústicas. Um espaço que olha para esse objetivo e para o futuro, criando algo que reflita o que realmente queremos ser: um hub para a arte e a cultura, rompendo fronteiras, estimulando encontros, potencializando histórias e ecoando cada vez mais vozes. Um movimento importantíssimo que fizemos nesse espaço foi o investimento em estúdios de gravação. São 4 estúdios, montados com equipamentos de ponta e possibilidade de serem interligados, o que nos dá uma capacidade muito grande de produção. É o coração artístico dessa estrutura, concebido para promover camps de composição e produção, e estimular projetos e colaborações.
E as perspectivas para o futuro?
Diante do mercado diverso que temos hoje, precisamos ter diversas ofertas e serviços para os diferentes objetivos e perfis de artistas. Desde a distribuição tradicional de músicas, através da ADA; serviços que podem ir complementando esse modelo de distribuição; e claro, seguir em nosso DNA, que é construir carreiras sólidas de artistas. Queremos ser uma plataforma completa para eles e para os fãs. Além disso, também é nosso foco com a regional, seguir com o trabalho de levar para fora do país nossa música e nossos talentos. Sabemos que segue sendo desafiador, mas é sem dúvida um grande objetivo.
No mercado internacional, a WMB tem investido em ativações no Metaverso, Web3 e NFT. Qual é a importância da tecnologia para a gravadora, especialmente no mercado brasileiro?
Acredito que apesar das realidades distintas de nosso país, a tecnologia segue permeando nossa realidade, cada vez mais. Metaverso, Web3, Gaming, tudo isso nos traz possibilidades que, mesmo parecendo distantes, abrirão outras portas e outros modelos de negócio, como marcas, por exemplo.
Ainda falando de tecnologia, quais são as apostas da companhia para os próximos anos? No que pretendem investir para o crescimento da marca em âmbito nacional e internacional?
A tecnologia e a velocidade crescente com que inúmeras possibilidades vão surgindo são absolutamente parte de nosso planejamento. Temos experts totalmente focados nessas evoluções, todo o tempo. Nesse tema, não poderia deixar de citar a IA, com suas ferramentas e impactos nas mais diversas áreas. Quando falamos de música, de artistas, falamos de pessoas, suas vozes e criações. Sabemos o quão relevante pode ser o leque de possibilidades que virão por aí, mas é fundamental encontrar equilíbrio e entender qual o melhor caminho nesse universo, para artistas, fãs e empresas.