Privacidade é elemento-chave do projeto-piloto do real digital
Entre as diretrizes do Banco Central para essa iniciativa está garantir a observância das regras de sigilo bancário e de proteção de dados nas transações.
Thamilla Talarico, sócia-líder de blockchain e ativos digitais da EY Brasil. (Foto: Divulgação)
O real digital deve estar em conformidade com os princípios e as regras de privacidade e segurança previstos na legislação brasileira, com destaque para a Lei do Sigilo Bancário e a LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados). Essa é uma das diretrizes definidas pelo Banco Central para o projeto-piloto dessa iniciativa. “A privacidade, ao lado da programabilidade, tem sido a prioridade de momento do real digital, com tecnologias em teste considerando principalmente esses dois aspectos”, disse Thamilla Talarico, sócia-líder de blockchain e ativos digitais da EY Brasil, na Febraban Tech 2023.
O projeto-piloto do real digital entrou em fase de testes neste mês por meio de um grupo de 16 consórcios formados por bancos, startups de criptoativos e fornecedores de infraestrutura de tokenização e de ativos digitais. O BC escolheu a Hyperledger Besu como a rede ou tecnologia para o projeto-piloto justamente pela possibilidade de usá-la de forma fechada. Isso significa que as iniciativas feitas por meio dela estão sujeitas a um controle central, que pode ser realizado por um governo, uma empresa ou um grupo de pessoas. No caso do real digital, essa centralização será do Banco Central.
Além disso, a Besu, que é uma DLT (Distributed Ledger Technology), registrando, portanto, as transações feitas pelos usuários, oferece ganhos de programabilidade, como os smart contracts ou contratos inteligentes, além de proporcionar todos os benefícios do Ethereum, dando suporte a inovações próprias dos criptoativos, como tokens e demais recursos encontrados nas finanças descentralizadas (DeFi). Um dos objetivos do projeto-piloto é testar a interoperabilidade da rede Besu com outros protocolos de blockchain e de ativos digitais. “Como o BC diz, seu papel é prover a infraestrutura. O desenvolvimento do negócio, por meio de produtos e serviços inseridos nessa infraestrutura, fica com o mercado”, afirmou Talarico.
Starlight
O projeto-piloto do real digital vai simular transações de emissão, resgate e transferência desses ativos, bem como os fluxos financeiros decorrentes das negociações. As transações vão contemplar a liquidação condicionada e simultânea entre os ativos registrados. “O objetivo é garantir o Delivery vs Payment ou DVP até o nível do cliente final. Ou seja, a propriedade é transferida ao mesmo tempo do recebimento do recurso pago por ela, com a transação efetivada por meio do real digital tokenizado. Essa capacidade tecnológica é chamada de liquidação atômica”, observou Talarico.
A privacidade é um dos desafios para enquadrar transações de tokens originados de blockchains públicas nas regras de sigilo bancário e de proteção de dados. “Pensando nisso, apresentamos ao BC uma solução aberta, de domínio público, que pode, portanto, ser utilizada e testada por todos, para garantir a privacidade e o sigilo bancário de informações sensíveis nas transações do projeto-piloto do real digital”, disse Talarico.
A Starlight utiliza o protocolo conhecido como ZKP (zero-knowledge proof), que se trata de uma tecnologia criptográfica voltada para a comprovação da veracidade de uma informação sem que ela seja totalmente revelada para os envolvidos em uma transação. Uma pessoa pode, por exemplo, comprovar que tem saldo para efetivar uma transação, sem exibi-lo. O sigilo não se aplica apenas a transações financeiras e se estende para aplicações em blockchains públicas compatíveis com a rede Ethereum, incluindo a Hyperledger Besu do real digital, envolvendo canais de distribuição, logística, compras, cadeias de suprimentos, além de segredos comerciais, industriais e patentes.
“Utilizamos código de preservação de privacidade para embaralhar informações transacionais sensíveis de contratos inteligentes de blockchains abertas, que são bem transparentes, mas não estão em conformidade com as regras de sigilo bancário brasileiras e internacionais. Essa solução é resultado do trabalho do time global de P&D de blockchain da EY, que há anos tem investido no desenvolvimento de ferramentas que possam trazer os benefícios de blockchains públicas a empresas, reguladores e pessoas”, finalizou a executiva.