Ao integrar relatórios de sustentabilidade e financeiro, normas do ISSB combatem greenwashing
Os objetivos de sustentabilidade das empresas precisam ser detalhados no relatório financeiro, atendendo assim aos anseios dos investidores
Os objetivos de sustentabilidade das empresas, como a meta net zero, precisam ser detalhados no relatório financeiro, atendendo assim aos anseios dos investidores (Foto: Unsplash)
As normas IFRS S1 e S2, lançadas recentemente pelo ISSB (International Sustainability Standards Board), braço da IFRS Foundation para sustentabilidade, promovem a integração ou conectividade entre os relatórios financeiro e de sustentabilidade. Isso significa dizer que os objetivos de sustentabilidade traçados pela empresa que tenham impacto financeiro precisam ser considerados ou justificados no reporte financeiro. A consequência imediata é o combate ao greenwashing, prática que consiste na divulgação falsa ou imprecisa por parte das organizações de iniciativas de sustentabilidade.
Uma organização, por exemplo, que divulgue sua meta de ser net zero até 2030 no relatório de sustentabilidade deve demonstrar como viabilizará financeiramente esse objetivo. Será por meio da compra de crédito de carbono ou desenvolvendo operação específica que neutralize sua emissão de carbono? Também precisa mostrar o impacto financeiro que será gerado por esse movimento em suas operações, como diminuição dos lucros, ainda que momentaneamente, por causa do investimento necessário para adequá-la a essa realidade de emissão líquida zero de carbono.
O mesmo raciocínio se aplica a uma organização que divulgue a meta de renovar seu maquinário, tornando-o verde. Ela precisa demonstrar no relatório financeiro como fará isso – quanto será investido em qual período e o que será feito com o equipamento atual. “Não há de forma geral essa visibilidade atualmente para os investidores, que precisam enxergar os planos financeiros da empresa para atingir os objetivos de sustentabilidade traçados, como o net zero. O detalhamento desses investimentos é indispensável para atender aos anseios dos investidores, que farão projeções muito mais assertivas e confiáveis a partir desses insumos, a fim de decidir ou não pela alocação de capital”, diz Renati Suzuki, gerente sênior de Sustainability Accounting & Reporting da EY. “É comum ver o CEO destacando o objetivo de tornar a empresa net zero. Somente a intenção não se sustenta, sem dados financeiros que embasem essa meta de sustentabilidade, contribuindo para o aumento dos casos de greenwashing”.
As normas do ISSB trazem outro efeito desejado pelo mercado: o da padronização, permitindo que as iniciativas de sustentabilidade sejam finalmente comparáveis. “A IFRS, uma instituição global de credibilidade, desenhou os padrões de divulgação de contabilidade internacionalmente utilizados e agora, por meio do ISSB, está fazendo o mesmo procedimento em relação à padronização de sustentabilidade”, afirma Suzuki. Essas regras estabelecem, ainda, que as organizações reportem riscos e oportunidades de sustentabilidade considerando toda a operação, e não apenas uma fábrica ou outra, sempre de forma integrada com o relatório financeiro. Além disso, ambos os relatórios – financeiro e de sustentabilidade – precisam ser divulgados no mesmo período – até porque essas informações, como mencionado, devem estar integradas.
“Se não houver governança, a empresa corre o risco de divulgar algo que não está fazendo ou sem o detalhamento financeiro necessário. Há preocupação por parte das organizações com a definição de processos e controles para que as informações de sustentabilidade sejam fidedignas e comparáveis”, destaca Mariana Lebreiro, sócia da EY em FAAS (Financial Accounting Advisory Services). “A definição de uma periodicidade de checagem dessas informações, a adoção de métodos de avaliação e identificação dos riscos de sustentabilidade, o acompanhamento das métricas de performance, incluindo o impacto na remuneração e no controle de capital, além da tomada de decisão baseada nesses dados, são aspectos que precisam ser observados”, completa.
Próximos passos
Basicamente, a IFRS S1 estabelece diretrizes para o reporte de sustentabilidade, por meio de quatro pilares (Governança; Estratégia; Gestão de Riscos; e Métricas e Objetivos), enquanto a IFRS S2 define como deve ser o reporte de riscos e de oportunidades relacionados ao clima, que são necessários para avaliar o impacto das mudanças climáticas sobre a empresa.
A implementação dessas normas deve começar em janeiro de 2024, dependendo do arcabouço regulatório local, com fases e regras de transição previstas para facilitar sua adoção pelas organizações. A IFRS S1 e S2 não são obrigatórias, mas podem assim se tornar, dependendo da regulação adotada por cada país. A regulamentação local fará com que essas normas do ISSB passem a integrar o arcabouço regulatório do país. Ao fazer isso, definirá se elas serão de cumprimento obrigatório ou voluntário.
No Brasil, a IFRS S1 e S2 serão traduzidas pelo CBPS (Comitê Brasileiro de Pronunciamentos de Sustentabilidade), levadas a uma consulta pública e encaminhadas para reguladores como a CVM (Comissão de Valores Mobiliários), podendo impactar as empresas brasileiras de capital aberto, subsidiárias ou que tenham operações em países que sigam as normas do ISSB.
“Ainda que a regulamentação não venha agora, no curto prazo, as empresas devem se planejar desde já para estar em conformidade com essas regras que serão adotadas globalmente. A IFRS S1 e S2 são essencialmente normas de contabilidade que incorporam os impactos da sustentabilidade e das mudanças climáticas nas organizações. A estratégia de sustentabilidade deve estar no cerne dos negócios, com uma governança inteiramente voltada a ela”, finaliza Lebreiro.