Virgínia Pillekamp. da EY: ‘Com o alinhamento às regras da OCDE, e a uma tributação incidente sobre o consumo mais neutra, o Brasil passa a integrar o mapa global de investimentos’
Reforma tributária deve fazer parte da análise de investimento em novas fábricas e centros de distribuição.
Virgínia Pillekamp, sócia especialista em tributos indiretos da EY. (Foto: Divulgação)
A retirada gradual dos incentivos fiscais fará com que as empresas repensem seus modelos de negócio, como o posicionamento da cadeia produtiva e da malha logística. Com a reforma tributária, os estados e municípios não poderão mais usar legislações próprias para atrair investimentos por meio dos incentivos fiscais, já que o IBS (Imposto sobre Bens e Serviços), de competência compartilhada entre esses entes, terá a mesma alíquota.
“As organizações aprenderam a trabalhar no Brasil com os incentivos fiscais, norteando ao longo dos anos suas decisões de investimento com base nesses benefícios”, diz Bruna Felizardo, sócia especialista em tributos indiretos da EY, que participou do debate “PEC 45 aprovada: o que vem por aí?” promovido pela EY. “Nesse cenário, elas se posicionaram longe dos seus centros consumidores para aproveitar os benefícios fiscais, já que eles mais do que pagam o valor do gasto logístico e operacional de uma operação distante do mercado de consumo”, completa.
Os investimentos a longo prazo, como uma nova fábrica, requerem ainda mais atenção e precisam ser revistos desde já. “Pode ser que eles não se justifiquem mais do ponto de vista do retorno esperado, considerando 2033 como o ano de extinção dos incentivos fiscais. É preciso fazer simulações com os incentivos fiscais no centro delas para verificar a viabilidade do investimento”, afirma Bruna. Por outro lado, se o objetivo for fazer um novo centro de distribuição que não seja tão complexo para ser construído, precisando de menos tempo para ser desmobilizado, o investimento pode se pagar no curto prazo, considerando que os incentivos fiscais serão retirados gradualmente.
“Essa avaliação precisa ser feita também em relação à estrutura tributária formada pela empresa para lidar com a complexidade fiscal do modelo que será substituído. No novo sistema, pode ser que não faça mais sentido que alguns setores trabalhem com dois CNPJs distintos, um que cuide da manufatura, por exemplo, e outro do marketing e distribuição, como ocorre hoje”, explica.
Ainda segundo ela, as empresas precisam analisar seus estabelecimentos e estrutura de funcionamento com um olhar voltado para as características do novo modelo tributário. “A própria dinâmica de precificação dos bens e serviços vai mudar, podendo abrir margem para novos concorrentes e alterar o perfil das empresas atuantes no mercado”, finaliza.
Para Waine Peron, sócio-líder de impostos da EY Brasil, que também esteve no debate, as linhas de produtos ou serviços das empresas precisarão ser reavaliadas para entender como elas se sustentam na nova estrutura tributária, que trará efeitos econômicos para o mercado.
“Isso afetará a estratégia de negócio das empresas, que precisarão revisitar, por exemplo, aspectos como reposicionamento da cadeia de suprimentos e da cadeia de valor, além de logística, logística reversa e outros temas correlatos aos benefícios fiscais que levaram as empresas a escolher esses locais”.
Por fim, Virgínia Pillekamp, sócia especialista em tributos indiretos da EY, observa que a mudança da legislação em relação ao preço de transferência vai potencializar essa reanálise das decisões tomadas em termos de estrutura de negócios.
“O ponto muito positivo é que o Brasil, com o alinhamento às regras da OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico) e a uma tributação incidente sobre o consumo mais neutra e transparente, passa a integrar o mapa global de investimentos, aumentando o potencial de crescimento econômico”.
Próximos passos
O texto constitucional da reforma tributária promulgado no fim do ano passado será regulamentado por meio de legislação complementar. O prazo é de 180 dias contados da promulgação da reforma para que o Poder Executivo envie para o Congresso Nacional os projetos de lei voltados para essa regulamentação.
“Serão discutidas as questões operacionais do novo sistema tributário, como o detalhamento de como se dará a tributação no destino e as obrigações acessórias que serão necessárias. A expectativa é que essa nova sistemática seja muito mais simples do que a de hoje, cumprindo assim o propósito da reforma tributária de simplificar a conformidade fiscal por parte das empresas”, diz Bruna.
“Se isso realmente acontecer, poderemos ter uma função fiscal mais dedicada aos questionamentos estratégicos para as organizações, já que consumirá menos tempo para a conformidade, com seus profissionais antecipando tendências e dando insights para os negócios a partir da interpretação dos dados, por meio da utilização da inteligência artificial generativa”.