80% das pequenas e médias empresas que atuam virtualmente estão no Sul e Sudeste
Pesquisa mostra que espaço geográfico brasileiro continua influenciando o e-commerce, apesar das transações virtuais.
Pesquisador afirma que a concentração das empresas nos mesmos centros não é necessariamente ruim, pois promove sinergia dentro do território onde estão localizadas. (Foto: Unsplah)
O comércio passou por diversas transformações ao longo do tempo e precisou sempre adaptar-se às necessidades dos consumidores. Atualmente, o modelo de comércio virtual facilitou as transações e agilizou o procedimento de compra e venda, possibilitando que as negociações sejam feitas sem a presença física dos envolvidos no processo.
Apesar da praticidade trazida pelo modelo remoto, o espaço geográfico continua a exercer influência na forma como as transações são realizadas. Igor Venceslau, doutor e mestre em geografia humana pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da Universidade de São Paulo (USP), comenta o impacto do território nesse método de negócios, assunto que foi tema de sua tese de doutorado.
Justificativas da pesquisa
O pesquisador conta que, após o início da pandemia de covid-19, período em que houve aumento no processo de compras online, ele quis entender se essa atividade, que dispensa localização exata, ainda é influenciada por temas recorrentes da geografia, como as desigualdades regionais.
Venceslau decidiu utilizar dados de preço e frete das grandes empresas do ramo comercial e cruzou as informações com o que observou em pesquisas de campo por todo o País e, dessa forma, destaca o sucesso das grandes instituições em diferentes países, apesar das diferenças geográficas presentes.
“A Amazon, por exemplo, consegue realizar essa atividade de maneira diferente justamente porque os países são diferentes e então entender essa geografia e os territórios nacionais continua sendo relevante na economia digital. O comércio eletrônico pode ser entendido como um fenômeno geográfico, nós pensamos que, por tudo ser realizado virtualmente, esse aspecto não teria relevância, mas tem”, conta Venceslau.
Especificidades do Brasil
Venceslau diz que o comércio, desde a antiguidade, foi entendido como um evento geográfico e ressalta o deslocamento que os comerciantes e os compradores realizavam até as feiras e pontos de negócios. No presente, esses locais de negociação são os shopping centers e os centros comerciais das cidades.
No Brasil, um dos pontos que mais chamaram a atenção do pesquisador foi a concentração geográfica das empresas no território nacional. Segundo ele, todos os 57 grandes grupos comerciais mapeados pelo estudo localizam-se nas regiões Sul e Sudeste, principalmente na Região Metropolitana de São Paulo.
“É o local onde a industrialização ocorreu, então é a região economicamente mais desenvolvida do País e surge como a única localização possível para que essas empresas possam agir à distância. Os centros de processamento de informações conseguem controlar os fluxos de mercadoria e dinheiro à distância, ou seja, os consumidores estão lá na Amazônia ou Nordeste e conseguem comprar virtualmente, mas sempre mercadorias que estão nesses grandes centros”, conta.
A pesquisa também mostrou que pequenas e médias empresas também estão localizadas nas regiões mais desenvolvidas do País, apesar de poderem ser encontradas em locais mais isolados. Segundo Venceslau, 80% das pequenas e médias empresas que atuam virtualmente também estão no Sul e Sudeste.
Aspectos técnicos
Para Igor Venceslau, a questão técnica é uma barreira para o consumidor comum, pois ele dificilmente enxerga a complexidade existente por trás das negociações virtuais. Além da loja, estão envolvidas nas transações uma variedade de agentes de marketing, financeiros, de pagamentos e de tecnologia da informação, como softwares, algoritmos, robôs e inteligências artificiais.
Segundo o pesquisador, a qualidade da conexão com a internet é fundamental para o processo, pois permite agilizar a troca de informações entre cliente e vendedor. A logística também é bastante influente, já que atua no fluxo das mercadorias e possibilita a rápida chegada do produto ao consumidor final.
O especialista afirma que a concentração das empresas nos mesmos centros não é necessariamente ruim, pois promove sinergia entre elas dentro do território onde estão localizadas; contudo, ele alerta para a dificuldade que essa questão traz para o desenvolvimento do País. “Do ponto de vista do desenvolvimento econômico, para pensar o futuro e o que se abre com a economia digital, é um grande desafio essa concentração e desigualdade que a gente encontrou”, finaliza.