Juiz diz que arte não pode ser censurada e absolve comediante de Live da Ofensa

O juiz André Luis Rodrigo do Prado Norcia, da 3ª Vara Criminal de São Bernardo do Campo (Grande São Paulo) ,absolveu sumariamente o comediante Vinícius Teixeira Lima do crime de injúria racial durante a Live da Ofensa. Em sua decisão, André Prado destaca que a "criminalização de piadas afronta o direito à liberdade de expressão" e que não é possível usar o direito penal para promover censura.

A "Live da Ofensa foi realizada pelos irmãos Vinícius e Guilherme Teixeira Lima em transmissão ao vivo em outubro de 2024. O Ministério Público de São Paulo ofereceu denúncia ao considerar que algumas piadas seriam enquadradas no crime de injúria racial contra duas pessoas.

O juiz André Prado ressalta que a liberdade de expressão é um dos princípios que fundamentam a Constituição. Ele entende que a lei tipifica a injúria racial como crime de racismo - uma das primeiras leis sancionadas no terceiro mandato do presidente Lula, em janeiro de 2023 - e possui duvidosa constitucionalidade.

Para o juiz, se houver um contexto ou intuito de descontração, não se pode afirmar pretensão de se praticar discurso de ódio ou ofensa. André Prado Norcia pontua que com base em estudiosos, não seria possível existir piada sem uma microagressão".

Causar risos

"Não pode o Estado, através do direito penal, diminuir o direito à liberdade de expressão. Opiniões não podem ser criminalizadas. A arte não pode ser censurada. A criminalização de peças teatrais, roteiros, livros, shows, filmes, em suma, de quaisquer manifestações artísticas e/ou culturais vai de encontro à proteção constitucional."

Ele é taxativo. "O Estado não pode, por suas instituições, afirmar que determinada piada constitui discurso de ódio - e por isso crime - uma vez que é arte e evidentemente tem finalidade diversa, a de causar risos."

Sem fazer uma menção direta ao caso Léo Lins, o juiz cita episódios de pessoas das "mais diversas minorias" que defendem fortemente todo tipo de humor, por mais ácido que ele seja. No início de junho, o humorista Léo Lins foi condenado pela Justiça Federal a oito anos e três meses de prisão por "discursos preconceituosos contra diversos grupos minoritários".

A defesa de Léo Lins destacou a presença de pessoas de grupos minoritários que apoiam seu trabalho. O caso foi marcado por uma polêmica sobre o limite do humor, que estaria livre se circunscrito a um espaço de produção artística. Sobre isso, o juiz André Prado Norcia argumenta que "o direito não pode ser limitado aos profissionais e seus shows.

Sob pena de censura

"O direito constitucionalmente previsto não delimita o espaço para o seu exercício. Assim, independentemente do ambiente, se a pessoa exerce o seu direito de proferir uma piada, estará amparada pelo ordenamento jurídico, sob pena de censura", enfatiza. No mérito, o juiz considera que, embora os humoristas tenham proferido "inúmeras ofensas contra as vítimas", elas devem ser analisadas sob a ótica do crime comum contra a honra, no âmbito da ação penal privada.

André Prado ressalta que, embora não exclua a possibilidade de cometer injúria racial, foi levado em consideração o fato de o humorista Vinícius Teixeira Lima ser um homem negro."Restou evidente a falta de dolo específico por parte do réu Vinícius, apto a caracterizar a ofensa racial. Assim, absolvo sumariamente o réu Vinícius Teixeira Lima, o que faço com fundamento no artigo 397, inciso III, do Código de Processo Penal."

Em relação ao irmão de Vinícius, Guilherme, que também participou da live, o juiz pondera que houve sim ofensa de injúria racial direcionada a certas pessoas. "O réu proferiu uma ofensa específica: Eu transo com essa macaca preta.

No mesmo momento, inclusive, causou constrangimento para Vinícius, que respondeu: Não, não. Eu não vou rir disso... Como se o problema dela fosse a cor. "Em relação a Guilherme, o juiz confirmou o recebimento da denúncia pelo crime de injúria racial.