Bastava simples despacho para nomear comandantes aderentes a plano de golpe, argumenta advogado

O advogado Paulo Amador Bueno, que representa o ex-presidente Jair Bolsonaro na ação penal da tentativa de golpe de Estado, afirmou nesta quarta-feira, 3, que o ex-chefe do Executivo "não pretendeu" dar golpe de Estado e "não teve intuito de ir adiante com projeto criminoso" narrado na denúncia da Procuradoria-Geral da República e "não deu início aos protocolos rígidos para instalação de estado de sítio ou defesa". "Não tem rascunho ou identificação de que se pretendesse ir adiante com isso", destacou.

O advogado pontuou ainda que Bolsonaro teria mecanismos para conduzir o "projeto", mas não o fez. O argumento do advogado é o de que a falta de adesão dos chefes das Forças Armadas seria "facilmente superada" pelo ex-presidente. Lembrando que o presidente tem a prerrogativa de nomear os comandantes militares, Bueno destacou que "bastava um simples despacho" para que Bolsonaro tirasse os comandantes dissidentes e nomeasse "comandantes aderentes" ao projeto de golpe.

Citando o código penal soviético e a história de uma pessoa que foi condenada sob a acusação de atentar contra o Estado soviético por urinar contra a parede do Kremlin, Bueno sustentou que a denúncia da PGR é "exaustiva", mas "não há elemento que aponte ato violento ou de grave ameaça a Bolsonaro".

O advogado fez a ponderação sob o argumento de que os crimes imputados a Bolsonaro - golpe de Estado e abolição violenta do Estado de Direito exigem que a conduta seja desenvolvida só e somente mediante atos de violência ou grave ameaça.

Segundo o defensor, Bolsonaro discutir mecanismos constitucionais com chefes das Forças Armadas não significa violência nem grave ameaça, assim como outros episódios narrados na denúncia do PGR. Bueno ainda argumentou que quem desiste da execução de um delito deve responder apenas por atos já praticados. Assim, uma condenação do ex-chefe do Executivo significaria uma punição da "tentativa da tentativa" de golpe de Estado.

"A acusação pretende expandir o tipo penal, alcançar fatos que o princípio da legalidade não alcançaram. Se pretende punir meros atos preparatórios e, em se tratando de crimes de empreendimento, estaríamos punindo a tentativa da tentativa. Atos preparatórios só poderiam ser punidos com autorização expressa", afirmou. Segundo o advogado, tal previsão existe para os crimes de terrorismo, mas não para os crimes de estado de direito.

Atos preparatórios

O advogado Celso Vilardi, que também representa Bolsonaro na ação penal da tentativa de golpe de Estado, argumentou que, por opção do Legislativo, o Brasil não tipificou os chamados "atos preparatórios", o que significa que o ex-presidente não poderia ser condenado pelos fatos narrados em seu processo.

Vilardi afirmou que, em se tratando de um crime de atentado, neste caso contra o Estado democrático de direito, "a mera tentativa é que configura a própria consumação do delito". "Mas não é porque é de atentado que não tem o início de execução", justificou.

"O que se quer é dizer que a live que deu margem à investigação no TSE, a reunião ministerial, a reunião com embaixadores e a reunião de 7 de dezembro seriam o início de execução do crime de atentado. Mas sem violência e grave ameaça? Onde está a violência e a grave ameaça? Dir-se-á que se houver a violência física e grave ameaça física, o golpe estará consumado. Mas não é por isso que não temos início de execução. Temos de ter início de execução. Teria que ser a assinatura, a concordância entre eles, mesmo antes de se pegar nas armas", afirmou o advogado.

Segundo Vilardi, afirmar que um "crime de abolição do Estado de direito começou em uma live sem violência é subverter o próprio Código Penal". O advogado de Bolsonaro citou que outros países também têm legislações que tratam da tipificação de crimes contra o Estado democrático.

"Foi discutida a questão no Brasil dos atos preparatórios. Nos EUA existe a questão da conspiração, em Portugal, os atos preparatórios, na Alemanha, os atos preparatórios. Sem violência. E o Brasil analisou isso no Congresso. Mas, por opção legislativa, eles não foram tipificados. Está no projeto de lei. Se alguém dissesse que a reunião com embaixadores e a reunião de 7 de dezembro têm de ser consideradas ato preparatório, fere o princípio da taxatividade, não se pode punir um ato preparatório", disse.

Pena

No fim de sua fala, Vilardi também buscou argumentar que a pena à qual o ex-presidente pode ser condenado "não é razoável". "Uma cogitação de pena para além de 30 anos para um fato específico que foi trazido pelo delator, a reunião do presidente com o ministro da Defesa e chefes das Forças, sem nenhum ato, sendo que o general citado como testemunha de acusação, respondendo a uma pergunta do ministro Luiz Fux, disse que depois da conversa o ex-presidente nunca mais tocou no assunto (...) Um assunto encerrado gerar uma pena de 30 anos não é razoável", disse o advogado.

Segundo ele, "o que está acontecendo é, na tese trazida por parte da PF e do MP, é trazer para algo que fala de crimes contra a vida, eliminação de pessoas, do 8 de Janeiro, que não precisamos dizer o que foi. São esses dois fatos que trazem o contorno para uma acusação tão grave, e nesses não há prova".